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O que está acontecendo com a dublagem brasileira?

Muito antes de descobrirmos os videocassetes(é o novo) ou a TV por assinatura, dependíamos exclusivamente do conteúdo da TV aberta. E todo o entretenimento vindo do exterior vinha obrigatoriamente dublado. Como não se tinha uma referência de material legendado, não tínhamos do que reclamar. A experiência de assistir algo na língua original só veio com os videocassetes e as locadoras de vídeo. Ainda assim, a dublagem permanecia firme e forte, mesmo com a internet nos dando mais opções.

Não que fosse uma coisa ruim. Por mais que se prefira assistir na língua original, é preciso admitir que o trabalho dos dubladores brasileiros é muito bom. Muitos atores de renome e personagens são quase impossíveis de se discernir dos dubladores que os traduziram para o público. E até mesmo alguns atores nacionais de renome começaram dublando.

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O Lima Duarte e o Manda-Chuva, da Hanna-Barbera, por exemplo.

E gostando ou não, a parcela de brasileiros que não conseguem acompanhar legendas é grande, então a dublagem de filmes e séries não é algo que possamos ficar sem.

Mesmo os detratores dos dublados admitem quando eles acertam. Quem acompanhou o anime Yu Yu Hakusho lembra do ótimo trabalho feito. Principalmente pela inovação: a inclusão de bordões tipicamente brasileiros.

E isso veio a se repetir muitos anos depois quando One Punch Man apareceu no Netflix; a internet não pôde deixar de se divertir bastante com o conteúdo.

É bobo mas faz muita diferença.

Desde que não hajam exageros.

(Des)encanto

O novo trabalho de Matt Groening, criador dos Simpsons, chegou ao Netflix dividindo opiniões. Houve quem curtisse, e também quem esperasse mais. O site Rotten Tomatoes mostrou algo parecido, tanto no meio de críticos quanto de espectadores. Mas a versão dublada trouxe algo a mais, algo de diferente do que Yuyu Hakusho e One Punch Man: memes.

O resultado foi divisivo. Houve quem dissesse quem tivesse ressalvas a respeito do uso, enquanto outros se divertiram.

Independente da opinião, não era algo que realmente comprometesse o resultado final.

Doctor Who

Após a nova temporada ter estreado pelo aplicativo Crackle, Doctor Who foi aos poucos mostrando problemas sérios de adaptação. E nem falo apenas da dublagem pois até a versão legendada mostrou problemas. E isso porque os responsáveis pela adaptação quiseram embarcar no bonde das referências brasileiras e… o resultado não pode sequer ser considerado controverso.

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Uma coisa que as outras adaptações conseguiram fazer foi garantir que as referências e memes não interferissem na compreensão da trama ou pudessem contornar referências que não pudessem ser compreendidas pelo espectador. Porém a equipe responsável não teve critério para realizar as adaptações, distorcendo cenas de fácil compreensão ou até mesmo estragando as referências originais.

Se você ainda não assistiu os episódios da série ainda e não quer spoiler nenhum vá direto para a parte de reações.

Óculos escuros

Em uma cena em que a Doutora empresta seus óculos escuros para Graham, ela menciona ter pego emprestado de Audrey Hepburn ou de Pitágoras(saquem a foto da Audrey). Alguém vê algum motivo para mudar isso? Bem, a equipe responsável pela adaptação viu:.

Sobre arte

Em uma cena em que a Doutora está escrevendo na parede de um hotel, Graham ralha com ela e pergunta se ela pensa que é o Banksy. A opção de adaptação da equipe trocou o nome por… Tarsila do Amaral!

Não achei link de vídeo ou print. Mas é só checar no Crackle, linkei lá em cima.

Nada contra a artista, mas o problema daqui é uma questão de contexto: Banksy é um artista de rua famoso por suas criações e por ninguém conhecer sua identidade(ou identidades, de acordo com os rumores). Adaptar para Tarsila do Amaral representa mais que uma tentativa de referência vazia; ela simplesmente matou uma excelente e bem contextualizada piada.

Boulos vs Bolsonaro

Pra manter a série dentro do contexto contemporâneo brasileiro, essas duas referências foram inclusas durante a discussão entre Yazmim e sua irmã no episódio Aracnídeos no Reino Unido.

O problema dessa cena foi que não só ela não influi e nem contribui, como também se tornará incrivelmente datada em pouco tempo.

A cena em que em que conhecem o personagem Jack Robertson apresenta outro problema.

Agora vejam a cena brasileira.

 

Eu me pergunto: pra que mudar? Só pela piada? Continuaria sendo engraçado se mantivessem o original, pois Ed Sheeran é um cantor famoso.E o melhor da cena foi realmente o punchline ao final. Adaptar foi um grande desperdício.

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Reações

E nem mencionei a falta de qualidade da dublagem. Alguns dubladores tem um sotaque estranho. E isso se explica porque a dublagem está sendo feita em Miami, numa decisão muito estranha da BBC para a adaptação.

Será que foi por economia? Não tenho certeza, mas tal decisão afetou em muito a qualidade de algo que poderia obter melhores resultados se tivesse sido realizado em solo brasileiro com profissionais experientes.

E a internet não teve piedade. O dublador Guilherme Briggs mostrou espanto no Twitter por ter achado antes que era uma dublagem de fã. Porém era o resultado oficial.

O dublador e diretor de dublagem Pedro Alcântara foi mais incisivo e iniciou uma thread explicativa e crítica sobre o caso. De forma didática e crítica, ele ressalta os pontos que formam uma boa dublagem, além de observações a respeito das piadas e das vozes escolhidas, dentre outros pontos que já discutimos.

Com a repercussão negativa deste caso, esperamos ansiosamente que os profissionais envolvidos pensem muito bem ao fazerem a adaptação de futuros filmes e séries. Nada contra a inclusão de gírias nacionais, um ou outro meme e outras referências. Mas não sacrifiquem o conteúdo original por isso. O fã é exigente com o que consome e descobre o que está errado num piscar de olhos.

Respeitem o fã. Ele não é bobo. E está de olho.

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Formado em administração e radiologia, professor por vocação e geek de coração!