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Resenha | Black Hammer. Origens Secretas (Lemire, Ormston e Stewart)

É quase certo que o leitor de quadrinhos já sabe quem é Jeff Lemire. As obras do escritor canadense vem sendo publicadas no Brasil com grande frequência. Trabalhos como Condado de Essex, Nada a perder e O Soldador Subaquático, quando foram lançados, receberam muita cobertura da mídia especializada de quadrinhos. O escritor até mesmo escreveu X-men para a Marvel no último ano e teve sua fase com o Arqueiro Verde para a DC Comics impressa em encadernados capa dura. A capacidade e confiança no autor em contar boas histórias é tanta que sua mais nova obra, Gideon Falls, mesmo não tendo terminado sequer a edição 06 nos Estados Unidos, já tem previsão de ser lançada pela editora Mino no segundo semestre de 2018 no Brasil.

Mas o que faz Lemire ser um quadrinhista de destaque e suas obras terem esse alcance tão grande?

Para o leitor que vem acompanhando a carreira do escritor, a resposta é fácil: o centro das histórias do autor é o desenvolvimento do lado humano dos seus personagens.

E isso Lemire faz com maestria em seu novo trabalho publicado no Brasil: Black Hammer.

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No volume 01 (Origens Secretas) dessa história de tragédia envolvendo super-heróis, somos apresentados a Abraham Slam, Menina de Ouro, Barbalien, Capitão Weird, Talky-walky e Madame Libélula. Heróis que, após um grande confronto com um ser chamado AntiDeus, foram trancafiados em uma cidadezinha americana chamada Black Hammer. Um local onde os heróis não podem passar dos limites da cidade, tendo que conviver com os humanos de lá, que tocam sua vida normalmente.

O objetivo de Lemire com Black Hammer é claro ao trazer o modelo dos super-heróis clássicos que povoaram a década de 1950/1960 e analisá-los sob uma ótima mais humana. É dessa forma que Abraham Slam encontra sua contrapartida em heróis como o Capitão América e o Demolidor da Marvel, sendo o mais humano dos heróis trancafiados e, consequentemente, o herói que mais se adequa a vidinha em Black Hammer. O Barbalien basicamente é o Caçador de Marte/Ajax da DC Comics, sendo um transmorfo de outro planeta que chega a terra e adota uma identidade de policial e vigilante. O Capitão Weird é uma homenagem aos heróis de ficção científica da década de 1950, como  Adam Strange da DC Comics. A Madame Libélula é claramente inspirada nos contos de horror produzidos pela EC Comics. Talky-Walky, conforme o próprio desenhista Dean Ormston afirma, é uma análoga a um robô da série Planeta Proibido. E a trágica e depressiva Menina de Ouro é basicamente a versão do herói Capitão Marvel/Shazam da DC Comics.

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Lemire é hábil ao contar a história dessas fascinantes homenagens de arquétipos de heróis clássicos dos quadrinhos. Cada capítulo de Origens Secretas nos apresenta o passado dos personagens, enquanto vai desenvolvendo a trama sobre o dia a dia em Black Hammer. É inegável que o autor pega o leitor pelo coração em muitas situações. Afinal, como não se importar com o drama da Menina de Ouro? Uma mulher madura que está presa em uma corpo de menina porque a palavra mágica que a transformava não funciona mais? E o Barbalien? Um alienígena que tem que esconder sua natureza duas vezes, uma por ser extraterrestre e outra sobre sua identidade sexual? Como não se importar sobre a aparente esquizofrenia do Capitão Weird, talvez causada pelas intensas viagens entre dimensões? E Abraham Slam, que encara Black Hammer não como uma prisão, e, sim, como uma aposentadoria após tantos anos de luta contra o crime?

São nesses pontos que a narrativa de Lemire cresce e aumenta nosso estímulo em continuar acompanhando essa saga. Porém, a homenagem clara a heróis clássicos é só a superfície da trama, já que outros pontos e situações que só os que leem quadrinhos identificarão. Vide o capítulo sobre a Madame Libélula. A narração original e sobre seu passado é claramente a mesma dos Contos da Cripta ou de obras como House of Mistery.

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Aqui cabe falar sobre o trabalho de arte da história. Normalmente, Lemire é um autor que assume os roteiros e os desenhos de suas tramas. Porém, o desenhista Dean Ormston assume o traço em Black Hammer. E isso é uma escolha acertadíssima. O traço de Lemire, conforme se pode ver nas capas alternativas que vem na edição brasileira, poderia ser classificado como estranho (só que conhece outras obras dele, como Condado de Essex, pode atestar isso). Já Ormston emula muito bem o clima das histórias de heróis da década de 1950/1960 e sabe criar um clima de quase depressão quando tudo se passa em Black Hammer. Esse sentimento de depressão e opressão é aqui ressaltado pelas excelentes cores de Dave Stewart, colorista famoso por ganhar muitos prêmios e por trabalhar em Hellboy ao lado de Mike Mignola.

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A edição da editora Intrínseca está na medida certa. Fugindo do esquema de capas duras que assolam o mercado brasileira, a edição nacional vem um formato de capa cartão com as 06 primeiras histórias do título americano. Conta ainda com um posfácio de Jeff Lemire, contando que Black Hammer é um projeto antigo, os esboços da ideia original desenvolvida pelo roteirista, o caderno de rascunho do desenhista, as capas originais e alternativas. É uma edição acertada para um título bom na medida certa. E melhor ainda: possui um preço bem acessível, em tempos de valores elevados nos lançamentos das editoras no Brasil.

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Contando com um texto primoroso que não só homenageia heróis clássicos como, também, desenvolve seus dramas ao se verem trancafiados em uma realidade que não podem escapar, Black Hammer. Origens Secretas é uma das leituras mais instigantes de Jeff Lemire, fazendo com que o leitor queira saber mais sobre a trama, já que esse volume inicial se foca mais em apresentar os personagens e desenvolver a trama na cidadezinha prisão de Black Hammer.

Ficha técnica:

Capa comum: 184 páginas;

Editora: Intrínseca;

Lançamento: 16 de maio de 2018;

Dimensões do produto: 25,8 x 16,6 x 0,6 cm;

Preço de capa: R$ 39,90.

Thiago de Carvalho Ribeiro. Apaixonado e colecionador de quadrinhos desde 1998. Do mangá, passando pelos comics, indo para o fumetti, se for histórias em quadrinhos boas, tem que serem lidas e debatidas.