O Eternauta é um clássico dos quadrinhos argentinos e será adaptado pela Netflix. Confira abaixo na matéria, que será a primeira parte de três, um pouco do quadrinho original.
Ás vezes, um quadrinho fala com o leitor sem precisar ser lido. Foi isso que ocorreu comigo e O Eternauta. Quando vi a capa da edição O Eternauta 1969 da editora Comix Zone, aquilo me chamou a atenção. E ao ler a sinopse da hq argentina, o interesse só aumentou. Mas não comprei logo a edição por motivos vários, como excesso de quadrinhos para ler e outras compras.
Mas a vida não seria tão aleatória e caótica se não fossem os fatos que não podemos controlar e nos pegam de surpresa. Uma amiga de minha esposa estava em Buenos Aires no finalzinho de 2019 e, já que tenho a tradição de pedir a cada amigo que viaja um quadrinho do país onde ele está, pedi para que ela comprasse uma hq argentina, de preferência, Mafalda.
Porém, ela não conseguiu uma edição argentina de Mafalda, mas falou que achou um quadrinho chamado El Eternauta. Novamente o personagem criado por Héctor Oesterheld e Solano López voltava para o centro de minha atenção. E mais uma vez para ser colocado de lado, já que minha pilha de leitura estava, e está, imensa.
Mas algo queria que eu lesse o quadrinho e conhecesse o personagem. E o gatilho foi o anúncio em fevereiro de 2020 de uma série televisiva de O Eternauta, que será produzida pela Netflix. A plataforma de streaming tem a cada dia investido mais em outros mercados, como na Coreia do Sul, Espanha e no Brasil, também.
Então, uma série baseada em um quadrinho de ficção científica que faz uma analogia aos tempos claustrofóbicos da ditadura na Argentina é algo que, com certeza, faz crescer em qualquer leitor de quadrinhos que se preze o interesse pela trama e seus personagens. Corri para ler o material original e a versão 1969 lançado pela editora Comix Zone, ficando maravilhado com a história, lamentando o porquê de ter demorado tanto para conhecer o quadrinho de Oesterheld e López.
A VERSÃO ORIGINAL DE O ETERNAUTA
Lançado em 1957 na revista Hora Cero Semanal, o título tinha nos roteiros Héctor Oesterheld e na arte Solano López. Por semana, eram publicadas 3 páginas da histórias, sendo que O Eternauta chegou ao fim do seu primeiro ciclo de histórias em 1959.
A trama de ficção científica acompanha inicialmente um quadrinista, que é o próprio Oesterheld, que vê aparecer em sua frente um viajante do tempo. Esse homem começa a contar a sua história, que se passa alguns anos no futuro.
É daí que conhecemos Juan Salvo, o personagem principal de O Eternauta. Em uma noite, quando jogava cartas com seus amigos Favalli, Lucas e Polsky em sua casa em Buenos Aires, onde estavam também a sua mulher Elena e sua filha Martita, estranhos relatos começam a serem notificados pelo rádio.
E já daí o quadrinho começa a brilhar. Como originalmente era uma história semanal de 03 páginas, era imperativo que o quadrinho prendesse a atenção do leitor de forma a continuar comprando as edições regularmente. É através das transmissões do rádio que somos informados que testes nucleares estão sendo feitos próximos da América Latina e que algo está errado.
A paranoia se estende quando uma neve mortal começa a cair na cidade de Buenos Aires, matando a todos e silenciando a capital argentina. Seria esse o inverno nuclear? Porém, a trama vai se desvendando e, não, o causador desse fenômeno não é um apocalipse nuclear. Na verdade, os relatos apontam para um invasão alienígena, sendo a neve uma arma biológica que mata ao pequeno toque, o que força Juan, seus amigos e sua família a se insolarem dentro de casa.
Percebesse que Oesterheld é hábil ao explorar as paranoias da década de 1950 nesse grande quadrinho de ficção científica, já que o medo nuclear e do desconhecido vindo do espaço estava muito em voga na cultura e no cotidiano da época.
E é desses medos e acontecimentos que os sobreviventes vão se deparar com o próximo desafio: a sobrevivência. Matando ao menor toque, a única solução para sair de casa e buscar alimentos é o isolamento completo do corpo. Daí, a icônica roupa de mergulho que o personagem usa.
Mas esse é apenas o começo da jornada d’O Eternauta, que passará ainda por uma guerra e se verá perdido no fluxo temporal, até fechar o ciclo nessa história de um náufrago do tempo que é o Robinson Crusoe de um apocalipse, nas palavras do próprio personagem e de seu autor.
As críticas sociais e os efeitos de uma Bueno Aires devastadas são muito bem retratadas pelos ótimos desenhos de Solano López, que transforma uma história semanal de 3 páginas em uma grande epopeia de uma época condenada, junto ao texto afiado de Oesterheld.
Para os leitores brasileiros que querem conhecer a obra original, a editora Martins Fontes publicou dois volumes contendo a versão original de O Eternauta em 2012 e 2013.
Apesar de já se passarem 8 anos da última publicação no Brasil, os volumes ainda são facilmente achados para compra na Amazon, conforme os links abaixo:
Mas e O Eternauta 1969? E o contexto histórico da criação da trama, já que foi criado durante uma das várias ditaduras militares argentinas? Qual foi o destino trágico de seu criador? E as nossas expectativas para a produção da série pela Netflix?
Bem isso é tema para a parte II e III dessa matéria, que busca apresentar ao grande pública esse clássico dos quadrinhos chamado O Eternauta.
1 Comment