Resenha crítica da primeira temporada de Dragon´s Dogma da Netflix sem spoiler
Adaptar um videogame para qualquer outra mídia costuma ser difícil de vender, por razões que geralmente são óbvias. Como? Bem, os videogames servem basicamente para dar a você algum controle sobre o que acontece em uma história (mesmo que a história seja apenas o “Pac-Man” que foge de fantasmas), e isso sempre se perderá quando você transformar essa mídia num filme ou série, ou – para escolher uma terceira opção totalmente aleatória – uma série de anime de sete episódios feito pela Netflix.
O outro lado da moeda, porém, é que levar um videogame para um meio diferente dá a suas partes não interativas a chance de ficarem no centro das atenções por um momento, o que a Netflix já conseguiu fazer com a obra-prima da animação Castlevania.
Dragon’s Dogma, a mais recente adaptação de um videogame feito pela Netflix, não é tão intermitentemente agradável quanto Castlevania, mas emplaca que adaptações as vezes nem sempre é uma ideia terrível.
Isso é um tanto surpreendente para Dragon’s Dogma, já que – ao contrário de Castlevania, que tem décadas de tradição e jogos para extrair – o jogo tem um dos principais atrativos eram criar seu próprio herói num de fantasia medieval e criar um personagem auxiliar chamado Pawn que você poderia compartilhar com seus amigos online para ajudá-los em suas aventuras.
Levar isso para uma série animada era um risco, já que o protagonista não foi você quem criou, então é algo muito positivo que Dragon’s Dogma conseguiu uma boa história para contar.
O herói que a Netflix entrega ao espectador é bastante genérico, claro, chamado Ethan. Ele mora em uma vila tão pacífica que os soldados que guardam suas fronteiras passam o dia todo se embebedando. Ethan é o mentor de um garoto que o respeita e o admira, e sua esposa que está prestes a dar à luz seu primeiro filho.
Se você já ouviu alguma história, mesmo que não conheça o jogo, você deve saber como é: no final do primeiro episódio, um dragão – o primeiro visto em um século! – atacou e massacrou todos naquela vila, deixando Ethan (que teve que assistir seu jovem amigo ser engolido e sua esposa ser torrada) como o único sobrevivente. Exceto que ele não sobrevive. O dragão leva um momento para provocar Ethan, propositalmente enfurecendo-o e arrancando seu coração em seguida.
Premissa mais batida e genérica que essa não existe, porém, a coisa melhora de uma forma surpreendente em seguida.
Já que isso transforma Ethan em um Ressurgido, o que nunca é realmente explicado na série, mas eu fiz a pesquisa para explicar e o que principalmente significa que ele agora é um herói sem coração que vagará pela terra e as trevas sempre lhe acompanhará, além desse “poder” de andar por aí sem coração, ele ganha um peão (um ajudante imortal sem emoções ou personalidade própria) para auxiliá-lo. Ethan e seu peão, que ele chama de Hannah, partem em uma busca para encontrar o dragão que está causando o terror nos outros reinos.
Dragon’s Dogma estabelece um design estrutural inteligente criado apenas para o anime. Cada episódio tem o nome de um dos sete pecados capitais, e a trama então envolve alguém neste mundo de fantasia que parecia idílico sucumbindo ao pecado de mesmo nome e se tornando presa de um grande monstro ou se tornando um monstro. RPG de terror purinho.
E essa estrutura configura um desenvolvimento de personagem agradável, mas previsível para Ethan e Hannah. Há também uma reviravolta que acontece no final do jogo que foi usada na série animada, então qualquer pessoa que sabe sobre isso deve saber o que esperar de Dragon’s Dogma. Ainda assim compensa assistir até o final.
O problema com a trama e a narrativa, porém, é que eles são surpreendentemente bons do que legitimamente bons. A narrativa costuma ser muito desajeitada e, caso você não adivinhe a distorção com antecedência, ela é cuidadosamente explicada assim que começa a se desenrolar.
A dublagem também é um pouco áspera em inglês, por isso, assisti tudo dublado em nossa língua e está de parabéns quem fez isso, já que a versão original alguns dos personagens secundários são dublados pela mesma pessoa. Também senti que a narrativa torna os personagens secundários um pouco difícil se preocupar com seus desfechos, então qualquer tempo passado longe de Ethan e Hannah parece uma perda de tempo (especialmente porque o desenvolvimento mencionado acima ficou apressado em alguns pontos).
Também há um problema perceptível com personagens femininos, todas são objetos sexuais ou figuras maternais santificadas, que é extremamente difícil de ignorar no episódio incrivelmente misógino da “Inveja”.
Apesar das escolhas questionáveis feitas no episódio “Inveja”, Dragon’s Dogma é amplamente envolvente enquanto se desenrola. O truque final que ele puxa com sua história maior é legal, mas não há muito mais sobre a primeira temporada que seja especial ou único. Dragon’s Dogma funciona surpreendentemente bem como algo que não é um videogame, mas também funcionou melhor como um videogame. Gaste seu tempo. São sete episódios com menos de meia hora cada.
Leave a Reply