Resenha sem spoiler de O Diabo de Cada Dia. Um drama grego no meio dos Estados Unidos dos anos 50.
O Diabo de Cada Dia (The Devil All the Time) poderia ter sido facilmente adaptado de uma história de Eurípides ou Sófocles, mas em vez disso, é baseado no romance de mesmo nome de Donald Ray Pollock. O diretor com sangue brasileiro, Antonio Campos, junto com seu irmão, co-escreveu o roteiro baseado na obra de Pollock, sobre as vidas entrelaçadas dos habitantes de Knockemstiff, Ohio.
Desde o início, a tragédia grega se desdobra quando o narrador (narrado pelo próprio Pollock) detalha como os cidadãos de Knockemstiff estão presos em uma trilha que não podem ver, traçada por Deus. Não importa o que façam, suas vidas são informadas por esse plano e pelo trauma geracional que herdam de seus ancestrais. O que poderia ser mais reminiscente de uma tragédia grega do que isso?
Conseguir que alguém se sente e assista a um filme de duas horas e meia como este pode parecer uma façanha impossível, mas com um elenco gigantesco de atores e atrizes incríveis, ficou até fácil fazer isso. Particularmente quando apareciam Tom Holland e Robert Pattinson.
(Me senti compelido a mencionar que o elenco é inteiramente branco, o que é desagradável e problemático. A estreiteza da história, embora envolvente, não abre espaço para uma diversidade que não pareceria simbólica; um problema muito maior para resolver dentro da indústria e um assunto digno de seu próprio texto fora desta resenha)
O Arvin de Holland é, talvez, o maior “ator” (não literalmente, mas narrativamente) do filme, o único que busca romper a relação prescrita com Deus e o trauma herdado de seu pai. Essa sensação de tragédia predeterminada permeia o filme, especialmente a história de Arvin.
É também Holland quem é mais impressionante de se assistir, em parte devido à sua grande quantidade de tempo na tela, mas também por causa da intensidade moderada que ele empresta ao personagem. Ele vai de plácido e contido a explosivamente violento no que parecem segundos, e a empatia silenciosa que o personagem tem por sua ‘’meia-irmã’’ o torna mais do que apenas um vingador das desgraças de sua família.
Depois, há Robert Pattinson, cujo o sotaque sulista dublado é mais errado do que acertado, mas cujo o tom informal é palpável através da tela. Ele, como todos os outros no filme, são vítimas de suas próprias personalidades, intrínsecas à qual está sua relação com Deus. Como eu assisti dublado, querida dá meus parabéns ao Wendel Bezerra que fez uma voz completamente estranha e cheia de sotaques para o Robert. Quase não dá para perceber que era sua voz ali.
O mundo de O Diabo de Cada Dia é povoado por muitas pessoas realmente más, mas são todas atraentes e multifacetadas, o que os torna tão fascinantes de assistir. Mesmo quando eles fazem as piores coisas possíveis ou cometem erros fatais.
Se você não está disposto a desfrutar de uma boa tragédia grega, ainda assim achará o filme incrível. Talvez o melhor que assisti em 2020. O Diabo de Cada Dia pode não ser cheio de plots da maneira que você esperava, mas se você mantiver o ritmo devagar, as revelações lentas valem a espera.
O Diabo de Cada Dia está Disponível na Netflix.
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