Bons lançamentos chegaram às livrarias Brasil afora em fevereiro. O primeiro destaque fica por conta da estreia de Val Emmich em Os Prós e os Contras de Nunca Esquecer. Músico com extensa discografia e ator com participações em séries de sucesso a exemplo de 30 Rock e Vinyl, Emmich lançou este que é seu primeiro romance em 2017. Bem recebido pela crítica, que o comparou ao estilo de Nick Hornby, o livro ganhará adaptação para o cinema em breve.
Val Emmich na sua faceta musical. Convince Me fez parte da trilha sonora da novela Insensato Coração.
Outra novata que chama atenção é Gabriela Aguerre, com seu romance O Quarto Branco. Nascida em Montevidéu, no Uruguai, em 1974, veio para o Brasil ainda na infância. Jornalista de carreira, traz no seu trabalho de estreia uma meditação vigorosa sobre memória e descendência.
Quem também ganha espaço são dois clássicos de peso: Franz Kafka, com uma coletânea de contos, incluindo inéditos, traduzidos diretamente do alemão pelo premiado tradutor e escritor Marcelo Backes; e Óssip Mandelstam, um dos maiores poetas russos da História que ganha livro pela editora 34 reunindo dois textos em prosa, com tradução do sempre competente Paulo Bezerra.
Saiba mais sobre os livros nas sinopses abaixo:
.Os prós e os contras de nunca esquecer, de Val Emmich (editora Intrínseca, 320 páginas, preço sugerido R$ 44,90): Joan Lennon é uma menina de 10 anos com um dom surpreendente: ela é capaz de lembrar, com exatidão de detalhes, tudo que aconteceu com ela. Sabe quantas vezes a mãe disse “sempre dá certo” nos últimos seis meses, lembra dos dias e dos motivos para ter chorado, mas compreende também que nem todos têm essa capacidade.
A maioria das pessoas, ela sabe, esquece as coisas, mas Joan não quer ser esquecida pelos outros. Então quando depara no jornal com um concurso cultural intitulado “Próximo Grande Compositor”, ela encontra a resposta: uma boa música é impossível de ser esquecida. Ela só precisa achar o colaborador perfeito. E é aí que entra Gavin Winters.
Amigo de faculdade dos pais de Joan, Gavin é um ator famoso de Los Angeles que no momento enfrenta a dor terrível de ter perdido subitamente o namorado, Sydney. Depois de ter um vídeo seu em surto vazado na internet, Gavin decide dar um tempo na casa dos velhos amigos.
Logo que se conhecem, Gavin e Joan fazem um acordo peculiar: ele vai ajudar Joan com a música e em troca a menina vai contar tudo que se lembra de Sydney. Mas o que no início era reconfortante acaba se tornando uma tortura no momento em que Gavin é obrigado a encarar o fato de que o namorado talvez estivesse escondendo alguma coisa.
Emocionante e divertido, Os Prós e os Contras de Nunca Esquecer é um livro de estreia surpreendentemente encantador, para ser lido com Beatles tocando ao fundo.
.O Quarto Branco, de Gabriela Aguerre (editora Todavia, 120 páginas, preço sugerido R$ 49,90): Numa escrita envolvente e delicada, feminina e firme, este romance de estreia nos apresenta Gloria. Uruguaia criada no Brasil, tem cerca de quarenta anos quando vê ruir todas as certezas de sua vida após sofrer um aborto espontâneo e descobrir que seu corpo não será mais capaz de gestar uma nova vida. Demitida do trabalho e com o pai hospitalizado, ela retorna ao Uruguai da sua infância em busca de respostas e de um pouco de paz.
Lá, outros fantasmas estão à sua espera: a irmã gêmea que morreu com poucas semanas de vida mas cuja presença assombraria Gloria até sua vida adulta, e os ecos ainda presentes de um regime autoritário e violento que obrigou muitos uruguaios a buscar o exílio. Tudo isso é narrado com mão leve. Algumas passagens formam uma deliciosa crônica da saudade montevideana, outras fazem um inventário devastador do remorso e do declínio biológico. Um claro-escuro tão veraz quanto poético. Estreia de Gabriela Aguerre, O Quarto Branco vai da cólera ao regozijo, da nostalgia à vontade férrea.
.Blumfeld, um solteirão de mais idade e outras histórias, de Franz Kafka (editora Civilização Brasileira, 336 páginas, preço sugerido R$ 57,90): É uma antologia de heróis de Kafka organizada e traduzida diretamente do alemão pelo premiado tradutor e escritor Marcelo Backes, que também assina o posfácio. Além das narrativas mais conhecidas no Brasil – como Um artista da fome –, o leitor encontrará textos de Franz Kafka até então inéditos no país – como O guarda da cripta, o único drama que escreveu.
Os textos têm como marca a proximidade com a estranheza, o fracasso, aquilo que é tido como menor ou desimportante. Os personagens não se encontram no lugar opressor do poder. Até mesmo aqueles que realizam grandes feitos importam pelo próprio fracasso – como o recordista olímpico de natação que não sabe nadar ou o mítico Ulisses, que se lança corajoso às sereias, amarrado por correntes, com os ouvidos tapados por cera, incapaz sequer de perceber que elas não apresentam qualquer perigo, pois não sentem necessidade de seduzi-lo.
Ao traduzir, Marcelo Backes não se ilude com o silêncio das sereias e busca restabelecer de forma original, em nossa língua, as escolhas de Franz Kafka, de maneira que seja possível, como indica na nota à edição, levar o leitor à obra traduzida, e não de transportá-la, de arestas aparadas, ao encontro do leitor.
.O rumor do tempo e Viagem à Armênia, de Óssip Mandelstam (editora 34, 200 páginas, preço sugerido R$ 47,00): Óssip Mandelstam (1891-1938) é o autor de uma das mais importantes obras poéticas do século XX, admirada por nomes como Joseph Brodsky e Paul Celan. Na Rússia e no Ocidente, gerações de leitores viram na poesia e no destino trágico de Mandelstam um testemunho dos tempos hostis que o poeta chamou de “século-animal”.
Mas também a sua prosa é capaz de conjurar toda uma era da história russa. Em O rumor do tempo (1925), Mandelstam mescla as suas memórias de juventude ao ambiente artístico e cultural da São Petersburgo das décadas de 1900 e 1910. Aqui o estilo alterna entre o lírico e o polêmico, e o olhar do jovem arrebatado pela revolução de 1905 é contraposto à ironia do intelectual em conflito com a burocracia soviética.
Em Viagem à Armênia (1933), desafiando o encargo que recebeu para escrever um relatório sobre a jovem república soviética, o experimento com diferentes gêneros e vozes é levado ainda mais longe, em associações de puro lirismo; não por acaso, é a partir deste texto que Mandelstam quebra o silêncio poético que o acometeu por anos.
Nesta nova edição de dois marcos da prosa memorialística russa, a bela tradução de Paulo Bezerra, agora revista e com novas notas, vem acompanhada de um ensaio, inédito no Brasil, do poeta irlandês Seamus Heaney, vencedor do Prêmio Nobel de Literatura em 1995.
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