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Janeiro Literário | As mil e Uma Noites de Mamede Mustafa Jarouche

As histórias que compõem o Livro das mil e uma noites  dispensam apresentações. Todo mundo já ouviu falar por exemplo na história da Sherazade, a moça que narra histórias pro marido com o intuito de permanecer viva. O que a tradução de Mamede Mustafa Jarouche tem de diferente?


O que nem todos sabem é que as versões conhecidas não são exatamente fiéis às originais, uma vez que foram “abrandadas” nas traduções publicadas anteriormente no Brasil. Isso mudou com o lançamento em 2004 de uma nova edição pela Biblioteca Azul, reunido em um box com 4 volumes.

Mamede Mustafa Jarouche fez um trabalho fantástico, traduzindo diretamente dos textos árabes. Pela primeira vez o leitor brasileiro teve acesso ao material original, com exceção da tradução feita por D. Pedro II. Segundo Jarouche, o imperador teria vertido para o português 120 noites (volume IV, p. 15).

A edição é riquíssima, com notas detalhadas sobre as traduções; o histórico dos textos; a literatura árabe em si além de curiosidades sobre a própria língua e cultura.

Edição lançada originalmente pelo selo Bibilioteca Azul

Descobrimos, por exemplo, que o nome original da Sherazade é Sahrazad (lê-se Xahrazád). A personagem, inclusive, rende comentários interessantes acerca do papel que desempenha a partir do ramo que se observa e considerando o respeito às mulheres que a sociedade do contexto demandava.

Na nota editorial, Jarouche explica que o Livro das mil e uma noites é, na verdade, um “conjunto pouco mais ou menos fabuloso de fábulas fabulosamente arranjadas” (vol. 1, p. 11), produzido por vários autores diferentes e em tempos diversos.

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Por conta disso, o tradutor explica que o livro remonta à matriz iraquiana, mas que a versão completa mais antiga conhecida atualmente foi reelaborada no período entre a segunda metade do século XIII d.C. e a primeira metade do século XIV d.C.

Esta reelaboração se subdivide em dois ramos: o sírio e o egípcio. Existem quatro manuscritos do ramo sírio – o mais antigo do século XI d.C. -, todos contendo 282 noites e se encerrando no mesmo ponto: pouco após o início da décima história principal, chamada “O rei Qamaruzzman e seus filhos Amjad e As’cad“. Não se sabe as razões da interrumpção narrativa.

Os manuscritos do ramo egípcio se subdividem em antigo (a mais antiga do século XVII d.C.) e tardio (elaborado na segunda metade do século XVIII d.C.). É com o ramo egípcio tardio que a narrativa passa a ter, de fato, 1001 noites.

Os volumes 1 e 2 trazem a tradução do ramo sírio, enquanto os volumes 3 e 4 concentram o ramo egípcio. Jarouche detalha as fontes utilizadas em cada tradução – tanto os manuscritos que foram fontes principais quanto aos que recorreu para sanar dúvidas quanto a passagens obscuras. No volume 4, temos ainda a tradução da história de Aladim e de Ali Babá.

A leitura pode ficar um pouco “travada” devido às notas e os anexos, mas é impossível ignorá-los sem o sentimento de que se está perdendo algo muito importante. Desse modo, os comentários do tradutor são um motivo a mais para adquirir a obra, pois ajudam a compreender diferenças entre os ramos, a opção feita por alguns termos e esclarecem trechos enraizados no imaginário árabe, cujo entendimento requer explicações esmiuçadas.

A edição se encontrava esgotada até ter os volumes relançados a partir de 2017 em versões revistas e atualizadas, ficando novamente ao alcance do público brasileiro. Vencedora dos prêmios Paulo Rónai (Fundação Biblioteca Nacional), Jabuti de Melhor Tradução e APCA (Associação Paulista dos Críticos de Arte), a obra é um conjunto de histórias que prima não apenas pelo valor literário em si, mas também pelo conhecimento da cultura árabe que traz em seu bojo.

Edição revista e atualizada que vem saindo desde 2017

Quer ser alguém importante na história do mundo, mas tem preguiça. Costuma ser do contra, gosta de coisas fofinhas, nasceu pras artes e foi trabalhar com coisas chatas pra não estragar os hobbies e nem passar fome.