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Crítica | Raised by Wolves é uma ficção científica distópica estilosa e intrigante

Julien Rico Jr
Arte: Julien Rico Jr

Ficção científica é um produto cultural que talvez dure e perdure por toda a existência humana na terra. Conheça Raised by Wolves, disponível no HBO MAX.

Esse texto contém alguns spoiler, ainda assim vale a pena a leitura porque eu não estrago os segredos da série. 

Usar a tecnologia da inteligência artificial, contar a história da humanidade e sua relação com o planeta não é algo que a cultura pop não tenha feito antes. Nem mesmo a HBO, só lembrar Westworld já conta como as vidas de robôs sencientes e rebeldes são exploradas para investigar a natureza do livre-arbítrio, além de conceitos sobre etnias, família e preconceito. Muito anos antes, Steven Spielberg também escreveu e dirigiu sobre as emoções e o futuro da humanidade por meio de seu incompreendido filme de 2001, A.I Inteligência Artificial.

Para se juntar nesta categoria que gosto tanto, estou aqui falando sobre Raised by Wolves, a ficção científica distópica épica da HBO Max criada pelo roteirista  e produtor americano Aaron Guzikowski. Em sua essência, a série tenta abordar o mesmo assunto que seus antecessores tentaram abordar antes: a natureza destrutiva da humanidade da perspectiva da I.A. 

Raised by Wolves
HBO Max/Reprodução

Mas faz isso de uma maneira empolgante e elegante por assim dizer. Portanto, mesmo quando alguns momentos da narrativa são referências a outras histórias do gênero, Raised by Wolves sempre encontra uma maneira de mantê-lo assistindo até o final cada episódio, graças ao roteiro intrigante de Guzikowski, a construção de um mundo hipnotizante e a direção sólida de seus talentosos diretores (os dois primeiros episódios são dirigidos por Ridley Scott, que também atua como produtor executivo).

A história é sobre uma terra num futuro distante, o planeta foi destruído por causa de uma guerra religiosa e agora o futuro incerto humano depende de dois andróides sencientes, Mãe (Amanda Collin) e Pai (Abubakar Salim), que têm a tarefa de criar seis filhos humanos em um planeta virgem misterioso chamado Kepler-22b. 

Raised by Wolves começa quando os dois acabam de chegar ao  planeta com nada além da determinação de criar e proteger essas crianças. Mas não demorou muito até que essa determinação se transformasse em medo e paranoia quando as crianças começam a morrer uma a uma por causa de uma doença que eles desconhecem ou acidente.

Das seis crianças, apenas um sobreviveu. Seu nome é Campion (Winta McGrath), e ele se certifica de fazer tudo que a mãe e o pai lhe dizem para fazer para não terminar com o mesmo destino de seus outros irmãos. Porém, qual criança humana obedece o pai e a mãe, mesmo eles sendo androides?

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Especialmente quando você vive em um planeta misterioso com criaturas perigosas à espreita em cada canto e aparece outros humanos falando que seus pais são na verdade o que causaram o fim humano na terra? Campion apesar de ser criança é o grande arco central da primeira temporada de Raised by Wolves.

Campion acaba descobrindo da pior maneira possível, que seus pais, principalmente sua mãe androide pode ser aterrorizante quando ameaçam seu filho e seu objetivo naquele planeta estranho.

Os humanos que chegam também no planeta Kepler-22b não passam de sobreviventes mortos de fome de uma arca/nave da religião mitraica. Eles são um dos lados que destruíram o planeta terra na guerra religiosa citada acima. Com a chegada deles é que percebemos os verdadeiros poderes da Mãe e compreendemos o que está em jogo.

Raised by Wolves
HBO Max/Reprodução

A chegada também desta colônia de uma comunidade Mitraica sobrevivente, bem como a revelação do poder da Mãe, é o que dá início ao enredo da primeira temporada. E de uma forma clássica da ficção científica, a tensão começa a surgir e os conflitos vão intensificando, principalmente após a introdução do personagem Marcus (Travis Fimmel), cujo filho, Paul (Felix Jamieson), junto com algumas outras crianças, é levado pela Mãe depois que ela destruiu sozinha a arca daqueles sobreviventes e matou todos lá dentro a sangue frio.

Esta premissa básica e o conflito entre a Mãe e Marcus podem não parecer muito empolgantes, e obviamente  não é uma novidade em outras histórias. Mas Raised by Wolves, apesar dessa familiaridade e de seu ritmo às vezes devagar, sempre sabe como manter as coisas inventivas e intrigantes a cada episódio, especialmente quando aprofunda os conceitos sobre o que é uma família e o que você é capaz de fazer para proteger seus filhos. 

E este elemento, em particular, é o que faz a série parecer comovente, apesar de seu tom violento e estranho.

A atuação de Fimmel como Marcus deve ser um dos pontos fracos da série. Ele é um ator incrível, isso ninguém discute. Marcus é o homem da família, mas vulnerável quando o assunto é seu filho Paul. O problema é que Fimmel sempre faz o papel de Fimmel em tudo que é projeto. E isso está ficando cansativo.

Antes de falar do papel de Amanda Collin, eu precisei dar uma olhada em seu perfil do instagram. Ela vive em outra vibração. Por isso que foi escolhida para esse papel tão marcante. É incrivelmente expressiva fazendo o papel da Mãe, transmitindo tanto a natureza robótica de uma I.A quanto às qualidades humanas de maneira excepcional.

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Embora o resto do elenco não receba os mesmos materiais substanciais que os dois atores mencionados acima, cada um deles fez o suficiente para trazer mais sabores à história, especialmente Winta McGrath, esse menino tem um futuro brilhante no cinema e TV.

A maior conquista de Raised by Wolve, no entanto, não é sua exploração filosófica da humanidade e da paternidade, ou as performances do elenco, mas do aspecto técnico. 

Desde do primeiro episódio, Raised by Wolves nos oferece um mundo que parece igualmente hipnotizante e assustador. É seco e lindo ao mesmo tempo. E é óbvio que o universo onde a série se passa, que é projetado e construído por Tom McCullagh (Game of Thrones) e Chris Seagers, é altamente influenciado por Alien de Ridley Scott

Para quem não conhece esses nomes, estamos falando de três caras que já ganharam todos os prêmios possíveis da TV e Cinema dos últimos 30 anos da indústria.

O que é fascinante sobre o design de produção de Raised by Wolves é como ele realmente é minimalista. Criado meticulosamente e o suficiente para evocar uma sensação de severidade distópica que Guzikowski está contando aos telespectadores. Achei os efeitos especiais um pouco abaixo da média, mas isso não influencia em nada a narrativa incrível e ambientação da série.

Raised by Wolves
HBO Max/Reprodução

A cinematografia estelar de Ross Emery e Erik Messerschmidt captura ainda mais essa severidade. O visual é acinzentado, mas nunca muito escuro ou desinteressante. A fotografia é bonita e a trilha sonora é nada menos que de Ben Frost, o cara que fez a trilha sonora da série da Netflix Dark, fazendo um trabalho maravilhoso de induzir a série com bastante tensão e uma sensação de desconforto ao longo de cada cena .

Uma curiosidade é que o nome da série Raised by Wolves, criados por lobos em tradução livre, tem bastante referência à mitologia romana. A lenda de Rômulo e Remo e o deus sol Mitra, O Sol Invictus.

No final, Raised by Wolves pode não dizer algo novo sobre a humanidade e a tecnologia que outras séries e filmes sobre andróides conscientes não disseram antes. Mas isso não o torna necessariamente desagradável. O impressionante trabalho técnico, as atuações sólidas do elenco – especialmente de Collin  – bem como sua  intrigante vontade de ser Mãe, são suficientes para fisgar você em cada episódio.

Recomendo. Vale a pena.

 

Disponível no Brasil pela HBO MAX.

Editor de Contéudo deste site. Eu não sei muita coisa, mas gosto de tentar aprender para fazer o melhor.