Mogli: Entre Dois Mundos é uma releitura sombria, séria e mais fiel do livro original de 1894 – O Livro da Selva (são três livros no total), de Rudyard Kipling. O conto que se tornou, para melhor ou pior, inextricavelmente ligado ao imaginário coletivo como uma coisa criada da Disney.
Mogli, do diretor Andy Serkis, intencionalmente evita esse tipo de carinho em favor de uma história menos divertida que se inicia em um mundo cheio de perigos, onde aprender a manter sua guarda atenta é uma lição fundamental para a sobrevivência. Esquecer disso fará com que você seja morto.
Mogli não é para ser popular, para agradar a massa como o remake do clássico da Disney de Jon Favreau, de 2016, que a Warner Bros. claramente percebeu que seria um fiasco de bilheteria e decidiu que era melhor o filme sair na Netflix depois de três anos trabalhando nele. A interpretação séria e quase erudita de Serkis não é decididamente infantil e não é, com exceção de alguns momentos mais leves, um filme para assistir com a família tradicional.
Em um filme totalmente dependente da ilusão de animais falantes e efeitos especiais suspeitos. Apesar de eu ter gostado das expressões humanizadas dos animais digitais, algumas capturas saíram melhor que as outras, em alguns momentos Shere Khan e todos os lobos, pareciam desenhos digitais inseridos no “mundo real”. É uma pena, já que os personagens animais são cruciais para a história e seu impacto emocional. Alguns críticos que deram notas baixas para o filme comentam quase a mesma coisa: Os efeitos visuais. E eles não estão errados.
Vários momentos a coisa fica inconsistente. Quer um exemplo: A Hiena. Ela sempre se destacava quando aparecia. Se fosse em 2002 teria sido revolucionário, mas não em 2018. E isso distrai quem está assistindo em vários momentos emocionais do filme.
Mas chega de falar dos defeitos do filme. Vamos falar o que ele tem de bom e surpreendente.
O elenco que dão suas vozes envolventes e sólidas. Christian Bale como Bagheera, Benedict Cumberbatch como Shere Khan, e o próprio Serkis como Baloo (retratado aqui mais como um professor do que um doce bufão). São performances incríveis, sendo que cada animal tinha aspectos dos atores que estavam ali emprestado suas vozes. Naomie Harris dá vida a Raksha, Peter Mullan é Akela.
Cate Blanchett empresta sua voz para a cobra Kaa e também narra o filme.
O Mogli de Rohan Chand quase sozinho mantém a história emocionalmente autêntica e envolvente quando os efeitos visuais dão uma escorregada. Este jovem ator intenso encontra a raiva e tristeza em um personagem que suporta o abandono e a perda. Seu Mogli já parece maduro apesar de sua jovem idade e pequena estatura; ele está literalmente marcado pela batalha de suas experiências, tornando-o menos um personagem que perde sua inocência e mais alguém fortalecido por conflitos e dificuldades com olhos bem expressivos. Acreditem se quiser, ele já tem 14 anos.
Outros personagens humanos incluem Matthew Rhys como Lockwood, um caçador britânico trazido para a vila dos homens para matar Shere Khan, e Freida Pinto como Messua, uma aldeã que ajuda a cuidar do feroz Mogli. Ambos os personagens visam “civilizar” esta criança selvagem, com um representando o lado negro da natureza humana e o outro seu lado mais gentil.
Esses personagens humanos servem bem às suas funções no filme, mas são os personagens animais que têm mais dimensão e humanidade.
Com Mogli, Serkis parece ter feito um filme que ele gostaria de assistir, um direito que ninguém pode tirar. Ele é um dos artistas mais incríveis que existe por trás das câmeras, mas como diretor precisa de uma bagagem maior e mais tempo.
Serkis deve ser aplaudido por fazer do jeito dele, e é uma pena que os efeitos visuais não estivessem a par com sua visão.
O Cavaleiro das Trevas, de Christopher Nolan, deu início a uma tendência que se mantém no cinema blockbuster até aos dias de hoje. Filmes negros, pesados e com temas profundos. A Warner Bros. / DC construiu todo o DCEU em cima dessa fórmula e agora chegou até nós uma adaptação bem pesada de O Livro da Selva.
Veredito
Mogli de Andy Serkis: Entre Dois Mundos é uma adaptação relativamente sem alegria de O Livro da Selva. É intelectualmente intrigante e bem atuado, mas os efeitos visuais inconsistentes não faz a gente entrar de corpo e alma na trama do filme. Ainda assim, é uma interpretação pensativa e dramática, que o diferencia da maioria das encarnações de The Jungle Book que conhecemos.
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