Texto por Bernardo Aurélio
Batman Grandes Astros já está há pouco mais de um ano nas bancas e apenas recentemente o peguei para ler. Preciso confessar que faz um bom tempo que não acompanho um título mensal de super-heróis, mesmo com toda a bem-sucedida campanha de retorno de leitores proporcionada pelo Renascimento DC, que reiniciou os títulos da editora. E não foi por falta de opções, apenas dentro do universo do Morcego, além do óbvio “Batman”, ainda há os títulos como “Detective Comics”, “Arlequina”, “Batgirl”, “Batgirl e as Aves de Rapina”, “Batwoman”, “Asa Noturna”, “Capuz Vermelho e os Foragidos” e, por fim, nosso “Batman Grandes Astros”.
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O título não se chama “grandes astros” à toa. A DC já lançou um “Grande Astros Superman”, por Grant Morisson e Frank Quitely, que é um sucesso de venda e crítica. Na verdade, a DC já havia lançado até um outro “grandes astros” do Batman antes que se chamava “Batman & Robin”, assinada por Jim Lee e Frank Miller (infelizmente, esse título não deu muito certo e poderemos falar dele aqui futuramente). Ao que tudo indica, pelos nomes envolvidos nesses projetos, os grandes astros em questão não são os personagens, mas os autores das revistas e isso fica evidente quando John Romita Jr (desenho) e Scott Snyder (roteiro) estão envolvidos nesse novo título.
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Eu folheava as edições que chegavam mensalmente e me agradava com o que via, primeiro porque adoro o traço do Romitinha (só para os íntimos). Mais também já havia lido “A Corte das Corujas” e “A Noite das Corujas”, do Snyder com o Bats lá no início dos Novos 52, e havia gostado muito. Então, fomos ler esse novo Batman Grandes Astros cheio de expectativas! Vamos analisar o arco inicial do título, que compreende as 5 primeiras edições da revista.
Batman Grandes Astros parece ideal para leitores como eu, que gostam do personagem, mas estão há um bom tempo sem ler seus gibis. A revista tem um formato diferenciado, com papel cartão e poucas páginas (em média, 36 páginas, por R$9,9). À primeira vista, trata-se de uma história independente, que você poderia começar a ler sem precisar de muito conhecimento do personagem. Infelizmente, não é bem assim. O primeiro incômodo é o personagem Duke, que é alguma coisa entre um ajudante do Batman, mas que não chamam de Robin.
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Duke é um “batman” espalhafatosamente amarelo, o que não combina com o clima soturno de Gotham. Pra quem nunca tinha lido um gibi com o personagem, a gente fica boiando um pouco. Mas deixa eu explicar: existem duas histórias paralelas sendo contadas na revista. Uma chamada “Meu Pior Inimigo”, essa pela dupla Romitinha e Snyder e a outra chamada “A Roda Amaldiçoada”, também do Snyder, mas desenhada por Declan Shalvey. A segunda é justamente focada em Duke, em um problema com sua mãe e no vilão Zsasz. Essa historinha tem apenas 4 partes de 8 páginas cada. Aqui vemos que existe toda uma história pregressa do personagem o que, realmente, não facilita se você não acompanha a série e os arcos antigos do Batman.
Duke apareceu pela primeira vez em Ano Zero, de agosto de 2013 durante a fase Novos 52. Houve alguns arcos depois, um deles foi o We are Robin (que saiu por aqui em Legado, A Sombra do Batman). Em “Fim de Jogo” (Batman 35, Novos 52 de junho de 2015) inicia uma história que tem ligação direta com “A Roda Amaldiçoada”, quando o Coringa rapta Duke e sua família e tenta recriar o assassinato dos pais de Bruce Wayne. No final de tudo, os pais de Duke são permanentemente afetados por um gás criado pelo vilão. O gás deixa as pessoas extremamente violentas contra aquilo que mais amam, o que torna o convívio de Duke com seus pais impossível. Nesse ponto, desconhecer o passado de Duke, não torna Grande Astros um bom ponto de partida para novos leitores, mas isso nem é o maior problema do quadrinho.
O fato de “A roda Amaldiçoada” ser uma história de 32 páginas, dividida em 4 pequenos capítulos não ajuda. A trama fica sem profundidade e as resoluções sem desenvolvimento. Zsasz aparece, ataca e é derrotado e só o que parece importar é fazer uma cena bonita.
Esse problema de desenvolvimento também está presente em “Meu Pior Inimigo”. Snyder parece esquecer que a forma de se contar uma história não é tão importante quanto o conteúdo e, tentando brincar de Tarantino em Pulp Fiction, conta sua história editando o quadrinho com vários recordatórios do tipo “Daqui a dois dias”, seguido de “20 horas atrás” e depois volta para “daqui a dois dias”, deixando o leitor à procura de qual é o momento zero da história, onde é o agora.
Esse tipo de ida e volta no tempo é estiloso, mas é uma armadilha onde creio que Snyder se atrapalhou quando deveria, simplesmente, contar uma boa história, mas preferiu usar artifícios deste tipo para deixar os furos no roteiro ou o mal desenvolvimento das cenas (inclusive às de ação) à critério da boa vontade do leitor preencher. Vou citar um exemplo: na edição 2 aparece Jade Nguyen e Jane Doe, as duas especialistas em veneno e “os indivíduos mais tóxicos do planeta”. Pois bem, uma flecha delas atravessa o Batman de uma ponta a outra enquanto ele está amarrado ao Duas Caras em cima de um trem em movimento. Ele tem apenas 1 minuto para fazer um antídoto. Ele explode o trem, cai da ponte, mergulha num rio e fica por isso mesmo. A gente conclui: “Ele é o Batman. É claro que ele conhece o tipo específico de veneno utilizado contra ele naquele momento, criado pelas pessoas mais tóxicas do mundo, e faz um antídoto com os ingredientes que carregava no cinto de utilidade. Afinal, ele está sempre preparado”.
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Vou citar outro exemplo: que diabos é aquela chuva ácida que queimou grande parte da população de Gotham? Isso não chega a ser um spolier, pois é um plot inicial da história. Esse fato é jogado ali e temos de saber lidar com isso: ou é um roteiro ruim ou é a continuação de um fato iniciado em outro momento, em outro gibi que desconheço e que, por isso, atrapalha, não faz jus ao início de um novo título, repetindo o problema do Duke. Isso sem falar de um aplicativo de celular, usado no final, para desobstruir as nuvens do céu de Gotham. É preguiçoso.
O quadrinho tem passagens boas, como os flashbacks envolvendo Bruce e Harvey ainda criança, ou mesmo o senso de humor que Snyder inclui no quadrinho: afinal nós temos um Batman capaz de sorrir (e isso é sempre interessante, quando bem utilizado, mesmo que apenas em um posfácio com um maldito recordatório “dois meses, duas semanas e dois dias depois”) e capaz de utilizar o death metal de uma banda chamada “A #$%&@ Batman” como arma contra seus inimigos.
Mas do que trata “Meu Pior Inimigo”? Batman precisa levar o Duas Caras do ponto A (Gotham) para o ponto B (local desconhecido, menos para o Batman). Segundo o próprio Harvey Dent, o objetivo é “leve-me até lá e arranque ele de mim. De uma vez por todas”, ou seja, a ideia é exorcizar o Duas Caras de suas vidas. O problema é que o vilão colocou a cabeça do herói à prêmio. Quem conseguir impedir a viagem e eliminar o Batman torna-se o dono da fortuna dos 3 maiores vilões de Gotham, numa transação bancária de forma discreta e irrastreável. A HQ torna-se uma grande perseguição e um desfile de super-vilões tão facilmente descartáveis que parecem jornal de embrulhar peixe ou que o gibi foi escrito por Jeph Loeb.
A parte legal é perceber que os homens comuns começam a entrar na corrida atrás do Batman, reforçando o ponto do discurso do Duas Caras, que diz que todo mundo possui um lado mau, que só precisa de um estímulo para aparecer, mas a ideia, novamente, não é bem aproveitada, revelando que o gibi realmente não procura aprofundar as frentes interessantes que abre, apenas procura uma diversão descompromissada e simples.
Esse é o ponto! Se você procura um gibi descompromissado, com um Batman apanhando sofrivelmente por 5 edições, usando brinquedinhos novos e recursos inéditos que dariam bons brinquedinhos, esse é o quadrinho para você. Nós temos orelhas que viram faca, botões escondidos em seu traje que disparam projéteis do peitoral e do punho, além de um batsoco-inglês no formato de morceguinhos. Aliás, acredito que criar todos esses gadgets visuais e sair enfrentando uma lista de vilões é o real motivo por trás desse quadrinho.
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Acho que vou reler meu Batman Grandes Astros do Frank Miller, que parecia não ir pra lugar nenhum, mas pelo menos era uma diversão mais sincera e descompromissada.
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