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Squid Game: A Ascensão e Queda de um Fenômeno | Resenha Crítica

Round 6 foi um sucesso calculado da Netflix ou um golpe de sorte? Leia nossa análise crítica que desafia a tese da "fórmula Netflix" e explora o poder da visão autoral e da cultura coreana no fenômeno.

Round 6
Round 6 - Netflix

Uma análise  de por que a primeira temporada foi genial e como as sequências provavelmente destruíram um legado.

Antes de apontar o dedo para os crimes das temporadas seguintes, é crucial entender por que a original foi um nocaute cultural. Não foi sorte. Foi uma tempestade perfeita.

Tinha uma Alegoria Social com a Sutileza de um Tijolo: E isso foi um elogio. A série não tentou ser um tratado filosófico complexo. Ela pegou a ansiedade do capitalismo tardio, o desespero da dívida e a desumanização sistêmica e transformou tudo em um espetáculo sangrento e direto. A mensagem era clara, visceral e universal.

Tinha uma Estética Viral: A direção de arte foi uma genialidade. Os macacões rosa, as máscaras geométricas, os cenários surreais com cores pastéis. Cada frame era um potencial meme, um wallpaper, uma fantasia de Halloween. A série era visualmente única e instantaneamente icônica.

E Uma História Fechada (Que Deveria Ter Continuado Fechada): O arco de Seong Gi-hun (Jogador 456) foi completo. Vimos sua degradação, sua relutância, seus compromissos morais e sua vitória vazia e traumática. O final, com ele se virando no aeroporto, era um gancho, sim, mas a história principal tinha um começo, meio e fim. Poderia ter sido uma minissérie perfeita, daquelas que assombram o espectador por anos.

Mas, como sabemos, o dinheiro fala mais alto que a integridade artística.

A pressão para replicar um sucesso global é um veneno. A segunda temporada, inevitavelmente, bebeu desse veneno e caiu na armadilha mais comum de todas: a “sequelite aguda”, onde “maior” é confundido com “melhor”.

Mas o que deu errado? A Perda da Simplicidade Psicológica. A beleza dos jogos originais (“Batatinha Frita 1, 2, 3”, “Cabo de Guerra”) estava na sua simplicidade. A tensão não vinha de regras complexas, mas do terror psicológico e da dinâmica humana. A 2ª temporada, na ânsia de inovar, certamente apostou em jogos excessivamente elaborados, cheios de reviravoltas e mecânicas confusas. O foco mudou do “o que você faria?” para “o que está acontecendo?”. O suspense deu lugar à confusão.

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A Expansão Exagerada do Universo. O mistério em torno do Líder e dos VIPs era parte do terror. Eles eram símbolos, não personagens. A segunda temporada, com certeza, sentiu a necessidade de dar uma backstory detalhada para tudo e todos, explicando a origem da organização, as motivações de cada engrenagem. Ao tentar construir uma “lore” (Universo Cinematográfico Squid Game™), a série diluiu o enigma que a tornava tão ameaçadora. Gi-hun, de um homem quebrado e moralmente ambíguo, iniciou sua jornada para se tornar um herói de ação genérico com a missão de “derrubar o sistema”. Previsível e decepcionante.

Se a segunda temporada foi um tropeço, a terceira foi a queda de um penhasco em câmera lenta. Aqui, a série já não se lembrava mais do que a tornou especial.

O erro fatal foi  o Abandono Completo da Tese (A sociedade capitalista moderna, com sua desigualdade brutal, cria um desespero tão profundo que pessoas comuns e boas são forçadas a abandonar sua humanidade e participar de um sistema sádico para ter uma mínima chance de sobrevivência). Squid Game deixou de ser uma alegoria sobre as vítimas do capitalismo para se tornar um thriller de espionagem e vingança. O foco mudou dos jogadores desesperados para a rebelião contra os organizadores. A crítica social, que era a alma da série, foi trocada por planos mirabolantes, infiltrações e tiroteios. Tornou-se uma série de ação padrão, perdendo completamente o dilema humano que a consagrou.

A fórmula já estava gasta. A essa altura, a série provavelmente recorreu a trazer personagens de volta de formas forçadas (o irmão gêmeo perdido de alguém?), reciclar conceitos de jogos com uma nova roupagem e se apoiar em referências à primeira temporada. O choque se foi, a novidade se foi. O que restou foi uma marca sendo explorada até a exaustão, ironicamente se tornando o próprio produto explorador que a premissa original criticava.

Mesmo em sua fase decadente, Squid Game ainda mantém uma vantagem sobre muitas produções americanas de grande orçamento por uma razão simples: sua audácia original. A série nasceu de uma visão singular, arriscada e culturalmente específica, não de um comitê focado em expandir um universo de propriedade intelectual já existente. Mesmo quando a execução tropeça, ela carrega o DNA de algo que não teve medo de ser estranho, brutal e profundamente pessimista. Muitas produções ocidentais de grande escala, presas à necessidade de agradar a todos e dar continuidade a uma franquia, frequentemente lixam suas arestas até se tornarem produtos seguros e previsíveis. Não é que o Ocidente não produza obras-primas – ele produz, e muitas. A questão é que, no campo do entretenimento de massa que vira fenômeno, Squid Game representa um tipo de criatividade “selvagem” que se tornou mais rara. Sua “superioridade” reside menos na qualidade (que se tornou questionável) e mais em ser um lembrete de que o público global ainda tem fome de ideias originais, mesmo que o prato principal venha seguido de uma sobremesa requentada.

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Ainda vale a pena assistir? Sejamos honestos, a resposta depende do seu nível de masoquismo televisivo.

A 2ª Temporada? Assista, mas com as expectativas no fundo do poço. Encare como um blockbuster de ação com um orçamento gigantesco. É visualmente impressionante, mas intelectualmente vazio. Se você conseguir desligar o cérebro e ignorar a memória da genialidade da primeira, pode ser um entretenimento passageiro.

A segunda parta da segunda temporada ou 3ª Temporada? Fuja. A essa altura, é um desserviço à obra original. Assistir só vai manchar a sua lembrança do que Squid Game um dia foi. É recomendada apenas para os completistas mais ferrenhos, aqueles que precisam ver o fim da história, não importa quão medíocre ele seja. Para todos os outros, finja que a série terminou na primeira temporada. Sua memória agradecerá.

 

Editor de Contéudo deste site. Eu não sei muita coisa, mas gosto de tentar aprender para fazer o melhor.