Não deixe de conferir nosso Podcast!

Resenha | O Irlandês

Com um ritmo lento e, ás vezes, desgastante nas três horas e meia de duração, O Irlandês é uma jornada  sobre a vida de homens poderosos no submundo do crime americano que encontram o auge e como eles caem, fazendo com que atores já consagrados como Robert De Niro e Al Pacino reascendam o antigo brilho de outrora, ao entregar mais um papel marcante em suas carreiras.

Resultado de imagem para o irlandês

É bom ser sincero com o leitor já no começo dessa resenha: O Irlandês não é para todos os expectadores. Longe de grandes sequencias de ação e de tomadas chamativas, o ritmo mais devagar, acompanhando os seus personagens em diferentes etapas de suas vidas, pode chatear o público que queria uma história mais ágil e sangrenta, como foi em outros trabalhos de Martin Scorcese, como em Os Infiltrados, por exemplo.

Para falar a verdade, não espere de O Irlandês um épico da máfia, sendo um novo O Poderoso Chefão. Talvez, a referência maior que temos aqui seria em Era Uma Vez na América, de Sérgio Leone, onde, também, atuaram Robert De Niro e Joe Pesci.

São três horas e meia de um filme que acompanhará a juventude (o começo), a vida adulta (o auge) e a velhice (a queda) de seus personagens, homens importantes da história americana, como Jimmy Hoffa, e outros nem tanto, mas que estavam nas sombras do poder, como o personagem principal, Frank “O Irlandês” Sheeran.

E é esse outro ponto que pode desagradar a platéia, em especial, a brasileira. O Irlandês é um filme sobre a história americana do crime entre a década de 1950 e 1970. Ou seja, quem não a conhece, como o assassinato de Jonh F. Kennedy (e seu envolvimento com a máfia) ou a importância do sumiço de Jimmy Hoffa, pode ter sérios problemas em se conectar com os personagens.

Esses são os dois fatores que realmente incomodarão a audiência que vai se deparar com esse conto sobre o envelhecimento e o poder que está presente em O Irlandês, trazido ao mundo pela Netlix.

Resultado de imagem para o irlandês

Acompanhamos Frank “O Irlandês” Sheeran, vivido por Robert De Niro, em sua ascensão junto à máfia, em especial, ao trabalhar com a família Bufallino, comandada por Russel Buffalino (Joe Pesci). Suas ações o levarão ao convívio de Jimmy Hoffa, famoso advogado americano, que tornou o seu sindicato o maior dos EUA na época, chegando a mais de 1,5 milhões de inscritos, e interpretado por Al Pacino, ator que há tempos não nos entregava uma performance tão magnética, com seus trejeitos e excessos nos momentos corretos.

Esse jogo de poder entre a máfia e Hoffa é a força motriz do filme, e, também, agente transformador de Sheeran, que tem a sua lealdade junto a Russel Buffalino, o homem que o acolheu, mas, ao mesmo tempo, cria uma amizade que parece genuína com Hoffa.

LEIA TAMBÉM:  Confira o que chega na Netflix em junho

E é aqui que está o maior ponto alto e que faz com que a jornada de três horas e meia de O Irlandês valha a pena: seus atores.

Resultado de imagem para o irlandês

Esqueça a atenção que os gastos com o rejuvenescimento de Robert De Niro, Joe Pesci e Al Pacino promovidos pela melhor tecnologia que o cinema pode ter. Se não fosse pela presença destes e por quem eles são e significaram para a história do cinema, O Irlandês ia naufragar lentamente, como sua narrativa lenta.

Ao trazer os atores que dominaram o cenário do cinema americano nos anos 1970 e 1980, Martin Scorcese acerta ao causar empatia com quem está diante do filme. Diga-se mais, o diretor basicamente ressuscitou a carreira de muitos ali, sendo até no sentido literal, já que o grande Joe Pesci estava aposentado há mais de 10 anos, só voltando para esse filme devido a presença de Scorcese e De Niro.

Um dos principais beneficiados é Al Pacino. Sem um bom filme no currículo há anos, o ator de O Poderoso Chefão faz um Hoffa magnético, que entende que trabalha com a máfia, mas não se sujeita a ela, sendo o seu norte apenas o sindicato que criou, e que o levará ao seu trágico fim. Não me espantaria ao ver o nome de Pacino indicado ao Oscar 2020.

Resultado de imagem para o irlandês

Esqueça o Joe Pesci histérico da franquia Máquina Mortífera ou aquele que entrega um papel semelhante ao que nos foi mostrado em Os Bons Companheiros, de Scorcese. O ator não está avesso a gritos ou ataques de fúria aqui. Ao contrário, é ele o mediador da máfia, sendo chamado para apaziguar assassinatos que podem levar a uma guerra. Mas o filme não nos deixa esquecer quem ele realmente é, seja chegando ensanguentando em casa em silêncio, ou quando manda matar outro mafioso na frente de sua família por um desaforo gratuito.

Porém, ao vermos se dirigindo a uma capela no final do filme, quando ele já está bem idoso, percebemos como o personagem está em paz consigo mesmo, o que é realmente comovente. Novamente, não me espantarei ao ver o nome de Pesci nas indicações dos maiores prêmios do cinema em 2020.

Resultado de imagem para joe pesci o irlandês

Por fim, temos nosso personagem principal, aqui vivido por Robert De Niro. E como ele é enigmático. Com um rosto de pedra que não esboça muitas emoções, Frank “O Irlandês” Sheeran transita em um ambiente onde é o matador da máfia e o segurança (e amigo) de Jimmy Hoffa. Porém, após várias tentativas de tentar conciliar os dois, Sheeran não titubeia ao escolher para quem deve sua lealdade, (SPOILER) tendo que matar Hoffa a mando de Buffalino.

LEIA TAMBÉM:  The Division 2: Um segundo chamado para os agentes

E é nesse momento que o rosto de pedra fixado por De Niro cai, ao expressar emoção ao cumprir a ordem. Esses pequenos momentos (como a despedida de Pesci) fazem o filme alcançar um novo patamar, como na morte de Hoffa e no momento em que a filha de Sheeran, vivida na fase adulta por Ana Paquim, pergunta POR QUE a De Niro.

É através de sua filha que Sheeran será julgado pela vida, sempre de forma silenciosa e com olhar inquisitivo. E ao ver Peggy Sheeran perguntar POR QUE (dando a entender que sabe que foi ele que matou Hoffa), percebemos como o personagem está fadado à uma condenação moral vinda de sua família.

Resultado de imagem para joe pesci o irlandês

Em relação a parte técnica e ambientação, O Irlandês é quase impecável. Tirando um momento ou outro onde a idade de De Niro fica bem à mostra, mesmo com o rejuvenescimento, o filme segue o alto padrão de produções como Os Infiltrados, Os Bons Companheiros e Cassino, filmes que contam com a trinca Scorcese, De Niro e Pesci.

E cabe aqui destacar o papel importante da Netflix em tudo isso. Esse é um filme que só existe por causa dela. Com os cinemas lotados de produções de fácil degustação (com humor e ação), infelizmente, o ritmo imposto por O Irlandês iria ser um fracasso nas salas de cinema.

O Irlandês se propõe a discutir mais coisas do que estão presentes em sua trama. O filme é uma grande produção, com nomes estelares, mas fora do circuito das salas de cinema. Chega a ser inconcebível que um filme com os nomes de Pacino, De Niro, Pesci e Scorcese tenha dificuldade em se financiar. Mas foi o que houve.

Se não fosse pela Netlix, não veríamos esse filme, mostrando o quanto os estúdios tradicionais de cinema não se arriscam mais.

Mas essa não é a única discussão que o filme traz. Com três horas e meia, o filme gera o debate da forma como se deve assisti-lo, já que alguns defendem que seja visto de uma sentada só, mantendo a experiência planejada, enquanto o serviço de streaming oferece a quem quiser a oportunidade de pausar e voltar novamente ao filme, e acredite, é o que muitos farão.

Resultado de imagem para joe pesci o irlandês

O Irlandês é um filme com um ritmo lento, chegando a ser desgastante. Mas seus personagens fascinantes, a força dos atores em seus papéis, o esmero técnico e o fim da jornada pela qual se propõe o filme fazem com que o novo projeto de Martin Scorcese seja lembrando como um grande drama sobre envelhecimento, lealdade e solidão. Um baita filme para ter em seu catálogo e a certeza de várias indicações ao Oscar esperam a produção da Netlix daqui pra frente, além de muito debate sobre sua a sua qualidade.

Thiago de Carvalho Ribeiro. Apaixonado e colecionador de quadrinhos desde 1998. Do mangá, passando pelos comics, indo para o fumetti, se for histórias em quadrinhos boas, tem que serem lidas e debatidas.