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D&Dezembro| Uma leitura sobre a Magia dentro da ficção

O elemento fantástico está quase sempre presente em nossas mesas de RPG, e parte da construção da fantasia está na Magia

A Magia dentro de cada cenário funciona de uma forma diferente, e dificilmente tem alguma definição específica que consiga definir bem o que ela realmente é e do que ela realmente se trata. Uma definição mais pé no chão seria dada pelo escritor de Ficção Científica Arthur C. Clark (2001: Uma Odisseia no Espaço, o livro.): “Qualquer tecnologia suficientemente avançada é indistinguível de magia”, e em muitos casos, isso pode se aplicar, e em outros isso é um fato canônico, como no cenário de Numenera.

Eu particularmente não gosto de pensar nas magias de RPG como “tecnologia avançada”, mas como uma filosofia. Sistemas como Ars Magica ou o brasileiro Daemon dão uma ênfase maior nessa leitura, associando a cada elemento e “verbo” uma filosofia distinta, tal qual a animação Avatar: A lenda de Aang.

Em Avatar vemos constantemente pessoas denominadas de “dobradores” fazendo com que algum elemento obedeça sua vontade, mas isso dificilmente tem um fundamento “científico” além da filosofia apresentada na própria animação: Zukko, o dobrador de fogo, é extremamente impaciente e volátil, Aang sempre tenta escapar de suas responsabilidades diretas (apesar de aceitar ser o Avatar, 40% da animação é ele zoando alguma coisa); Toph é dura e teimosa como a Terra que dobra e assim por diante.

Pode-se dizer que minha suspenção da descrença é melhor feita acreditando que aqueles seres humanos daquele universo específico são capazes de fazer algo que não existe no nosso, sem tentar criar uma ponte muito elaborada entre ambos, (pois, se o fizermos, a “terra” que a Toph dobra é feita de carbono e nossa carne também. Cadê ela dobrando a carne?) como associar a magia à presença de um mineral estranho e ficcional como feito em Dragon Age.

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Cada jogo e obra também tende a trabalhar a alteração de realidade de uma maneira distinta e única.

Jogos como D&D, onde o fato de a magia existir é mais importante do que saber como ela funciona normalmente tomam uma ação relativamente segura ao usar um sistema Vanciano de magia. Isto é, se baseiam na obra de Jack Vance para usar um sistema onde a magia deve ser “preparada” com antecedência e cada magia possui UMA finalidade específica, ou seja, feitiços que jogam uma bola de fogo não podem ser “diminuídos” para acender um cachimbo, por exemplo.

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Já em jogos como Ars Magica e os jogos do sistema Daemon como o Arkanun e o Trevas utilizam um sistema de “Verbo+Substantivo” para saber o que você consegue fazer com suas habilidades extraordinárias. Se você tem, por exemplo, um nível de “Controlar” e outro de “Fogo”, é exatamente isso que você consegue fazer, mas em um grau extremamente diferente do que se tivesse três níveis em “Controlar” e cinco em “Fogo”. O sistema Daemon usa 3 verbos: “Controlar”, “Criar” e “Entender” e uns oito ou dez substantivos, enquanto o Ars Magica expande isso com uns cinco verbos. Este sistema é interessante porque dá a ideia de “grau” de cada magia, e de um mínimo de subjetividade.

Existem também os casos onde a Magia é integrada no cenário e com consequências severas em seu uso, como em “Mago – O Despertar” ou “Mago – A Ascenção”. Nestes jogos, a magia é perigosa porque ela vai contra a “ordem natural” e parece machucar a realidade consensual se for usada de maneira exagerada, por isso, ela age na maior parte das vezes através de “coincidências”. Por exemplo: machuca menos a realidade se, ao invés de você soltar um raio pela mão numa perseguição de carros, o pneu do carro estourar, ele bater num poste e um fio de alta tensão atingir seu alvo. E o que acontece quando você “machuca” demais a realidade? Bem, para isso existe o sistema do “paradoxo”, e quando você “fecha” o paradoxo, a realidade dá um jeito de se livrar de você de uma forma criativa.

E dentro da literatura?

Nos livros e novelas também temos um espectro de como a magia funciona, que varia de “Soft Magic”, onde ela não é muito bem explicada ou se sabe os limites do que ela pode fazer, como em Senhor dos Anéis; até o “Hard Magic”, onde as regras estão claras e as limitações de suas habilidades também, como em Fullmetal Alchemist.

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Mas isso funciona como um espectro de luz, e há meios termos, como por exemplo na animação do Avatar. Embora esteja claro desde o começo que só o Avatar domine os quatro elementos, e que dobradores de diversas nações normalmente só dobram um (com algumas variantes), não é específico o suficiente para saber os limites do que um dobrador sozinho pode fazer.

Uma leitura sobre sistemas de magia “leves” (soft) é que ela não é uma temática central da obra, e vemos as magias sendo feitas a partir de olhos de pessoas que não a compreendem, como em Game of Thrones. Em contraponto, sistemas mais “duros” (hard) são bacanas de se ver quando são um elemento essencial da trama: Harry Potter, Avatar, Fullmetal Alchemist, etc.

Ambos possuem suas vantagens e desvantagens, como citado acima: Em Game of Thrones, se a magia fosse bem explicada através de um sistema, ela perderia boa parte de seu impacto e “sobrenatural”, mas se essa lógica for aplicada em um livro ou série onde o protagonista é um usuário de magia, isso dá uma desculpa conveniente para o protagonista sempre ter o que é necessário. Daí entra a necessidade de articular um sistema onde as regras façam sentido e não sejam quebradas, de forma a provocar satisfação na audiência ao mostrar as possibilidades de uso da magia “dentro das regras”.

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