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Crítica | Castlevania – 2ª Temporada

Castlevania, resenha da segunda temporada.

Hollywood conseguiu aperfeiçoar a fórmula de trazer o mundo dos quadrinhos para o cinema ao longo da última década, agora peça para ela fazer a mesma coisa com o mundo dos games e veremos ela falhar miseravelmente. É até uma boa pergunta, produzir uma adaptação de um game é tão difícil assim para a maioria dos estúdios? Por que, depois de todos esses anos, projetos como o Mortal Kombat, de 1995, e Silent Hill, em 2006, ainda se mantêm como os pontos de referência para esse gênero? E olha que Mortal Kombat nem é lá essas coisas.

 

 

Então, algo como a série Castlevania da Netflix surgiu para provar que tudo o que precisávamos era a combinação certa de uma pesquisa direto da fonte,  interessante e talento do roteirista, além de uma direção e dublagens incríveis. A 2ª temporada de Castlevania se transforma na melhor adaptação de um videogame para TV. E nem precisou gastar tanto.

A 1ª temporada chegou a Netflix em julho de 2017, oferecendo aos fãs quatro insignificantes episódios antes de desaparecer pelos próximos 16 meses. Felizmente, a Season 2 não só está caindo na melhor época para séries de terror, mas traz o dobro de episódios e mergulha muito mais fundo neste universo de horror fantástico. Além disso, você pode pular a primeira temporada se quiser, eles fazem uma sinopse dos quatro episódios.

A nova temporada coloca o caçador de criaturas das trevas Trevor Belmont (Richard Armitage), o meio-vampiro Alucard e Sypha Belnades (Alejandra Reynoso) contra o implacável Drácula (Graham MacTavish), que atualmente está em guerra contra a humanidade em retaliação pela morte de sua esposa, Lisa (Emily Swallow). E é bem aqui que está o pulo do gato desta série.

A maioria das adaptações de videogame teria deixado por aí, focando no fanservice  – a longa jornada através do Castelo Drácula, os quebra-cabeças e labirintos e lutas contra chefões e o confronto decisivo com o próprio Drácula. Mas enquanto algumas delas são incluídas, há muitas linhas novas de enredo e subversões inesperadas da fórmula mais comum. Por um lado, a segunda temporada apresenta ainda uma nova linha de personagens e vampiros para complicar a vingança de Drácula. O lorde vampiro solitário é acompanhado por tribos inteiras de vampiros, cada um com sua própria gama de habilidades, motivações e sensibilidades. Em especial a  traiçoeira Carmilla (Jamie Murray) e o bárbaro senhor da guerra Godbrand (Peter Stormare). Também um grande foco nesta temporada são os dois servos humanos de Drácula, o fanaticamente leal Forgemasters Isaac (Adetokumboh M’Cormack) e Hector (Theo James).

A coisa mais legal de Castlevania é o fato de que nenhum desses personagens caem perfeitamente nas categorias de heróis ou vilões. O escritor Warren Ellis dá a cada personagem principal uma quantidade impressionante de profundidade e nuances. O próprio Drácula continua sendo o ator mais convincente nesse enredo complexo. Ele é uma figura trágica, atacando o mundo dos homens depois que sua única chance de paz e felicidade foi roubada dele. Carmilla pode ser uma intrigante política, mas ela e seus colegas vampiros estão compreensivelmente preocupados com as ações questionáveis de seu mestre e com a aparente incapacidade de executar sua própria guerra. Isaac e Hector são fascinantes, com a série focando muito em suas motivações para se voltar contra a sua própria espécie e ajudar Drácula a cometer genocídio em larga escala. Até mesmos homens como Trevor e Alucard têm tanto desdém pela humanidade quanto seus inimigos, e por boas razões.

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Se for para reclamar de algo é a forma como os humanos são tratados na série. Praticamente gado para os vampiros e desprezados por todos os personagens.  Nós raramente vemos outros personagens humanos, exceto quando a série relembra a morte de Lisa Tepes ou vários outros atos de atrocidade humana sobre humanos. Lá pelas tantas, a série faz um trabalho quase bom demais para ilustrar a posição de Drácula, fazendo com que você se pergunte por que alguém se preocupa em lutar em defesa dos humanos covardes, hipócritas e supersticiosos em primeiro lugar.

A 2ª temporada permanece tão consistentemente cativante, apesar de se mover em um ritmo meio lento para alguns. A coisa só anda mesmo nos três episódios finais. Antes disso, o foco é fortemente voltado para o desenvolvimento de personagens. Acredito que daria para enxugar isso tudo e fazer um filme cabuloso de bom, mas no processo, essa história perderia a forte caracterização que dá o conflito seu peso em primeiro lugar.

Ellis prova ser mais uma vez um dos escritores mais legais da nossa geração. Tendo seguido sua carreira de quadrinhos por muitos anos, Ellis sempre me pareceu alguém que aborda propriedades licenciadas como uma espécie de exercício intelectual. Ele admitiu não ter familiaridade com a franquia quando foi chamado para ser o roteirista. Mas em vez de trabalhar contra esta série, essa distância parece ter dado a Ellis a capacidade de abordar Castlevania com um olhar clínico, escolhendo os elementos que se adéquam à sua história e descartando o resto. O resultado é uma nova história fiel ao espírito do material de origem, mas também um espirituoso e autoconsciente o suficiente para zombar de si mesmo quando necessário.

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Symphony of the Night e os desenhos de personagens de Ayami Kojima continuam sendo a principal fonte de inspiração visual para a série. O figurino e projetos arquitetônicos combinados com a iluminação mal-humorada fazem um bem danado para esta série animada superestilosa. Além disso, está muito bem desenhada, a animação flui e as batalhas soam reais e bem movimentadas.

 

A dublagem:

Netflix

A dublagem também está ótima, eu assisti a versão em inglês. Há sempre uma linha muito delicada quando se trata de descrever os vampiros como antagonistas trágicos e perpetuamente miseráveis. Eles ficam parecendo vampiros emos dos romances de Anne Rice. Aqui, as performances, roteiro e direção de arte, são responsáveis por equilibrar as coisas. McTavish faz um Drácula convincente. Callis como Alucard traz emoção ao personagem que no game é bem frio e quase não conversa. A coisa flui graças ao trabalho dos dois quando a relação pai / filho entre Drácula e Alucard se torna primordial. Murray é deliciosamente sinistra como Carmilla.

 

A Sypha de Reynoso é boa, mas seu exagerado sotaque do leste europeu é extremamente inconsistente. Não está claro por que ela está tentando imitar algo que não sabe, já que a maioria das vozes dos outros personagens são muito neutras. O tem o Godbrand de Stormare. É uma escolha divertida, embora a voz de Stormare não soe exatamente como um bárbaro celta, em sua  maior parte soa como alguém que sempre está bêbado, e nem sempre parece que ele está na mesma vibração de seus colegas vampiros. Talvez essa fosse a intenção.

Veredito

A segunda temporada de Castlevania não apenas oferece uma história mais profunda e com mais carne do que a 1ª temporada truncada, mas também oferece para gente que está assistindo, conhecendo ou não a história, uma conclusão muito mais satisfatória. No geral, esses 8 episódios contam uma história coesa e equilibrada de guerra sobrenatural e drama familiar. Muita coisa ainda vai acontecer já que a terceira temporada foi confirmada dias atrás.

Castlevania fez justiça ao material original de uma maneira que poucas adaptações de videogame conseguiram.

 

Netflix

Em uma época em que a maioria dos estúdios ainda não consegue descobrir como traduzir corretamente videogames para cinema e TV, Castlevania surge como o novo padrão. A 2ª temporada se baseia nos elementos que ficou da primeira temporada, expandindo o mundo e introduzindo personagens mais convincentes e cheios de nuances em uma guerra interna com Drácula. A série consegue ser fiel ao material original, enquanto ainda faz grandes mudanças quando necessário e enfatiza o crescimento de cada personagem. Simplesmente brilhante.

Editor de Contéudo deste site. Eu não sei muita coisa, mas gosto de tentar aprender para fazer o melhor.