Já se passarem três episódios e Doctor Who vai aos poucos mostrando o que Chibnall quer com a série. E, após conhecer novos amigos e recuperar sua nave em meio a grandes perigos, a Doutora finalmente retoma sua eterna jornada pelo tempo e espaço. E a série segue se diferenciando do tom da era Moffat, desta vez resgatando um elemento precioso dos primeiros episódios da série clássica.
Inicialmente, Doctor Who tencionava ser uma série educativa, voltada para o público infanto-juvenil. A intenção era ter momentos em que o Doutor e seus companions usariam de seus conhecimentos de ciências e história para lidar com os problemas que encontrariam pelo caminho. E agora que a Doutora finalmente tem sua TARDIS de volta, seus novos companions, que conheceram outro planeta, agora têm a oportunidade de finalmente viajar no tempo.
E estão prestes a testemunhar um evento histórico.
Rosa Parks
Nascida em Tuskegee – Alabama, em 1913 Rosa Parks era uma costureira. Casou-se em 1930 com Raymond Parks, membro da Associação Nacional para o Progresso de Pessoas de Cor (National Association for the Advancement of Colored People – NAACP) e tornou-se militante de causas de igualdade racial. E um de seus objetivos era o fim da segregação racial, que separava lugares entre brancos e pessoas de cor. E isto era forte em Montgomery, a cidade em que Rosa vivia.
Em 1 de dezembro de 1955, sentada em um lugar marcado para negros em seu ônibus após um árduo dia de trabalho, Rosa passaria pela gota d’água: após pegar passageiros extras e ao ver dois passageiros brancos estavam em pé, o motorista moveu uma das placas para brancos para a cadeira atrás de Rosa. O motorista requisitou as cadeiras mas ela se recusou a sair. Tendo sido denunciada, foi presa e o ato acabou em um boicote ao transporte público que, após 381 dias, resultou no fim da segregação racial.
O caso transformou Rosa Parks na “primeira dama dos direitos civis” e na “mãe do movimento pela liberdade”. Também deu destaque a vários ativistas, entre eles Martin Luther King Jr.
De volta para o passado
A nova tripulação da TARDIS acaba parando aqui por acidente. Como sempre, a Doutora não consegue conter sua velha nave e acabam parando em um ponto bem distante de onde queriam estar. Todos acabam se maravilhando por estar em outra época até o primeiro incidente motivado pelas diferenças raciais. Mas isso nem é o maior problema: tendo detectado o vazamento de um tipo de energia peculiar, a Doutora acaba descobrindo um complô temporal que pode alterar a história como a conhecemos.
Uma volta às origens
As lições de história são apenas uma parte do Chris Chibnall está retomando para Doctor Who. De fato, o conhecimento de história é crucial para que derrotem o vilão e mantenham a história intacta. Mas, assim como nos primeiros arcos, os companions é que se destacam. Sem acesso à internet ou terem livros consigo, a equipe só pode contar com o que sabem e com a capacidade de Graham de se relacionar com pessoas e obter informações(lembremos, ele mesmo é um motorista de ônibus). A determinação de Yaz, a engenhosidade de Ryan e a experiência de Graham são bem somadas para que alcancem seus objetivos.
Na série clássica, os acontecimentos daqui poderiam ser esticados em quatro episódios(o formato da série o dividia em arcos). Mas a trama é muito bem contada em um episódio de 50 minutos, em que todos correm contra o tempo para que a história aconteça no momento certo, mesmo com todas as reviravoltas.
E há aquele frescor em mostrar gente como a gente reagindo ao fato de estarem em outra época, sem Bad Wolves ou garotas impossíveis. A 10ª temporada já fez isso muito bem com Bill Potts e o critério se mantém com a nova equipe. E é sensacional ver suas reações: Yaz tem em Rosa uma heroína e tanto ela quanto Ryan já sofreram com o preconceito e agora o sofrem em uma época onde ele era muito mais intenso e reforçado por lei.
As cenas são feitas mesmo para ficarmos indignados. O racismo nunca foi abordado desta forma na série. A única vez em que foi, na temporada passada, fomos agraciados com uma cena catártica.
https://www.youtube.com/watch?v=CRQp5WOzYxg
Mas o desgosto é contrastado pela fascinação em encontrar figuras históricas que tanta diferença fizeram… e Rosa não foi a única que encontraram.
Um novo Vincent and the Doctor?
O que digo não contém spoilers: eles salvam o dia(e a história) em um final emocionante, mas um em que eles entendem o quanto pode ser difícil proteger a história e nem falo de tudo o que passaram para preservá-la. O final acabou por trazer muitos fãs às lágrimas.
That was one of the strongest, most beautiful, most empowering episodes of #DoctorWho ever written. What a phenomenal story, and a wonderful tribute to Rosa Parks’ resilience and bravery.
A huge thank you to @malorieblackman for that sensational story, that was so beautiful ❤️ pic.twitter.com/t3mxoqLflJ
— The Women of Who (@TheWomenOfWho) October 21, 2018
“Este foi um dos episódios mais fortes, mais belos e mais empoderadores de Doctor Who jamais escritos. Que história fenomenal, e um tributo maravilhoso à resiliência e bravura de Rosa Parks”
De fato, essa é outra quebra em relação às temporadas anteriores: a trilha sonora, antes exclusivamente instrumental, agora abre espaço para canções. E Rise Up, de Andra Day, foi perfeita.
O vilão
As motivações de Krasko(Josh Bowman, de Revenge), o vilão do episódio são revelados de forma sutil e são um reflexo do tempo em que vivemos. O que mais me chamou a atenção foi para o seu método, que lembra muito um antagonista com quem o Doutor, em sua primeira encarnação, havia se batido: o Monge do arco The Time Meddler, do final da segunda temporada de Doctor Who, transmitido em julho de 1965. Inclusive, em Time Meddler foi a primeira vez em que o Doutor encontraria outro Senhor do Tempo.
Ambos os personagens são viajantes do tempo que querem mudar a história. A diferença é que o Monge tem motivações menos mesquinhas para fazer o que faz. Krasko, por outro lado, nem mesmo um Senhor do Tempo é.
(E, se pararmos para pensar, o episódio faz uma reflexão sobre o uso de castração química como punição. Assista o episódio e veja se concorda comigo.)
E o próximo episódio?
Agora provavelmente teremos um pouquinho de horror no próximo episódio, onde finalmente teremos nossa trupe voltando ao lar para enfrentar ameaças de oito patas.
Você pode assistir os novos episódios pelo aplicativo Crackle, da Sony:
https://doctorwho.crackle.com/v2/index.html
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