Quem acompanha a chamada “Nova Série” de Dylan Dog pela editora Mythos sabe o quanto ela é cheia de altos e baixos. Publicando em ordem cronológica a fase sob curadoria de Roberto Recchioni, iniciada em 2014 lá na Itália, o título tem se revelado um desafio ao leitor fiel, frequentemente tentado a abandoná-lo. Tramas como “Um velho começo”, “Os abandonados” e “No coração do mal” exploram de maneira pífia o personagem, fazem mau uso de seus maneirismos e espalham sem muito apuro novos elementos e coadjuvantes.
Entretanto, também regozijamos com boas histórias, que aproveitam de forma dosada e esperta os traços clássicos do Old Boy dentro da continuidade proposta pelo editor. É o caso de “O inquisidor“, publicada no volume 15 do título, e na qual o roteirista Fabrizio Accatino inspirou-se em figuras históricas e eventos reais. Aqui, Dylan conhece o ator Ian Ogilvy, após uma sessão do clássico do terror “Witchfinder General”.
Uma das estrelas da película, Ogilvy convida nosso protagonista para um papo e acaba comentando suas suspeitas sobre a trágica morte de Michael Reeves, diretor do filme e que morrera tragicamente de overdose aos 25 anos. E se algo – ou alguém – tivesse algum envolvimento, desconhecido até então, no episódio? É o bastante para aguçar a curiosidade de Dylan, que começa uma investigação sobre a vida de Reeves e os bastidores do filme.
O roteiro evita invencionices nesse ponto e se atém a fatos conhecidos. Estrela em ascensão no meio cinematográfico, Michael Reeves tivera embates conhecidos com Vincent Price, ator que à época gozava de uma extensa carreira; o que revela de seu gênio forte e decidido. A personagem central do filme, Matthew Hopkins, foi um “caçador de buxas” que vivera no século VXII, e tido como o responsável por mais de 100 mortes no intervalo de dois anos, ao queimar mulheres em praça pública sob acusação de bruxaria.
O que Dylan desconhece a princípio é que o legado de Hopkins vive e a escolha por Michael para contar sua história não teria sido por acaso. E a verdade será revelada de maneira muito dolorosa… Como se vê, Accatino elabora um enredo investigativo, introduzindo paralelamente aqueles que carregam nos dias atuais o ofício da purificação odiosa.
Um ponto interessante e que merece nota é a participação de Groucho com suas tiradas cômicas. Muitas vezes, os roteiristas perdem a mão com o assistente de Dylan, enchendo-o de falas que confundem sarcasmo com verborragia. Aqui, seu humor está calibrado, rendendo boas sacadas no proverbial momento “romântico” da história.
E impossível por fim não destacar a arte, de uma plasticidade única, de Luca Casalanguida, no lápis fino e elegante. O modo como varia os tons de cinza para contrapor as sequências no presente com a reconstituição de cenas no passado, retratando a produção de “Witchfinder General”, enriquece o trabalho e mostra versatilidade. Uma leitura que renova, com louvor, o interesse no título.
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