A verdade é que “Indomável” é uma série superficial. E é exatamente por isso que ela faz tanto sucesso. Ela não é um prato complexo da alta gastronomia do streaming; ela é o Big Mac do suspense: você sabe exatamente o que vai receber, é industrialmente projetado para satisfazer um desejo imediato e, no final, cumpre seu papel sem deixar uma impressão duradoura.
O sucesso estrondoso de “Indomável” — figurando no Top 10 global da Netflix — não é um acidente, mas um sintoma. É um reflexo do nosso viés coletivo como espectadores: em um oceano de conteúdo que exige nossa atenção plena, a familiaridade é um porto seguro.
A Trama Sob o Microscópio
A premissa é simples: um agente especial (Kyle Turner, vivido por Eric Bana) com um passado convenientemente sombrio é enviado para o Parque Nacional de Yosemite para investigar um assassinato. Lá, ele se une a uma guarda florestal novata e idealista (Naya Vasquez). Juntos, eles caçam um criminoso que, veja só, conhece a floresta “tão bem quanto” nosso protagonista.
Ponto.
A matemática é simples, presta atenção:
- Herói Atormentado? Confere. O passado de Kyle obviamente se conectará ao caso presente.
- Parceiro(a) Inexperiente mas Sagaz? Confere. Serve como nossos olhos e ouvidos, fazendo as perguntas que o público faria.
- Cenário Isolado e Grandioso? Confere. Yosemite não é apenas um pano de fundo; é um artifício narrativo para isolar os personagens e aumentar a tensão.
- Comunidade com Segredos? Confere. Pode apostar que cada personagem secundário, do dono da mercearia ao eremita local, tem algo a esconder.
E a série não é boa porque desafia, mas porque conforta como direi a seguir:
O Fator Eric Bana e a Ilusão de Prestígio
Eric Bana e Sam Neill (que também faz parte do elenco) empresta uma camada de prestígio a um roteiro que, em outras mãos, poderia ser um filme de suspense esquecível da Sessão da Tarde dos anos 90. Bana, em particular, é especialista no “homem comum sob pressão extraordinária”. Ele vende o drama interno de Kyle com uma economia de gestos que faz o personagem parecer mais complexo do que realmente é. É uma atuação competente a serviço de um material derivativo.
Contraponto: A Eficiência da Preguiça
Será que o sucesso de “Indomável” é um atestado da preguiça do público? Ou será que é uma resposta à fadiga de narrativas excessivamente complexas, com linhas temporais múltiplas, simbolismos obscuros e finais ambíguos?
Há um argumento a ser feito de que a Netflix acertou em cheio ao oferecer um produto direto e sem rodeios. A série não exige que você crie um fluxograma para entender a trama. Os ganchos são eficazes, a resolução é satisfatória (ainda que previsível), e a jornada do ponto A ao ponto B é uma linha reta. Em um mundo que nos bombardeia com complexidade, a simplicidade de “Indomável” é seu maior trunfo e, paradoxalmente, sua maior falha artística.
“Indomável” não ficará para a história. Não gerará teses acadêmicas nem longos debates nas redes sociais sobre seu subtexto. Ela é um produto de seu tempo: um suspense descartável, feito para ser consumido rapidamente e esquecido com a mesma velocidade.
O seu sucesso retumbante é menos uma medida da qualidade da série e mais um espelho dos nossos próprios hábitos de consumo. Queremos o mistério, mas sem o trabalho de decifrá-lo. Queremos o suspense, mas dentro de limites seguros. Queremos ser “Indomáveis”, mas do conforto do nosso sofá.
E, aparentemente, a Netflix sabe disso melhor do que ninguém. Recomendo!














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