O ano de 2019 começa quente no mercado editorial brasileiro, com lançamentos que tratam desde feminismo e política a racismo, num reflexo das discussões em alta no país.
Uma olhada nos livros que saíram recentemente ou programados para janeiro revela título interessantes saindo por diversas editoras, como a Record, Companhia das Letras, Rocco e Todavia. São romances, biografias e ensaios que abordam temas relevantes e dialogam com o momento político atual, em que eventos históricos são questionados, conceitos são deturpados e grupos sociais têm sua voz posta em xeque.
O timming dos lançamentos não poderia ser mais apropriado. Ou mesmo proposital, rendendo um bom substrato para debates.
Nem tudo, obviamente, se enquadra nos tópicos apontados. A Rocco, por exemplo, disponibiliza novamente A Fogueira das Vaidades, clássico de Tom Wolfe, um romance abrangente e panorâmico, sobre como as pessoas viviam na Nova York dos últimos anos do século 20 e cheio de personagens e situações inesquecíveis.
Já a Companhia das Letras preparou um volume belíssimo reunindo todos os contos da grande escritora Lygia Fagundes Telles. A Todavia, por sua vez, apresenta ao público brasileiro Lucky Jim, hilariante sátira sobre vida acadêmica e hipocrisia social que sai pela primeira vez no país.
Mas são os títulos com potencial reflexivo ou polêmico (como queira o leitor) que chamam atenção nos catálogos pesquisados. Segue abaixo os destaques que pinçamos:
.Explosão Feminista (Companhia das Letras, 536 páginas, preço sugerido R$ 69,90): Fruto de extensa pesquisa, este livro procura apontar de onde vem a força avassaladora do feminismo na última década e as mudanças pelas quais passou ao longo dos anos.
A professora e escritora Heloisa Buarque de Hollanda, um dos nomes mais importantes na área cultural e nos estudos de gênero no Brasil, convoca jovens que estão marcando presença no ativismo, na poesia e nas artes para mostrar pontos de convergência e divergência entre os muitos feminismos que compõem o cenário brasileiro atual.
Como podemos definir esta quarta e explosiva onda? Quem são as mulheres que estão à frente dos movimentos hoje e o que elas reivindicam? Como a militância vem impactando a política, o comportamento e, sobretudo, a criação artística?
.O Fascismo Eterno (editora Record, 64 páginas, preço sugerido R$ 29,90): Uma reflexão atual, importante e necessária sobre o sentido da história e a importância da memória. Publicado pela primeira vez em 1997, como parte do livro Cinco Escritos Morais, O Fascismo Eterno chega aos leitores em nova edição no momento de ascensão mundial do flerte com o fascismo.
Segundo Umberto Eco, entre as possíveis características do Ur-Fascismo, o “fascismo eterno” do título, estão o medo do diferente, a oposição à análise crítica, o machismo, a repressão e o controle da sexualidade, a exaltação de um “líder”, um constante estado de ameaça, entre outros. O fascismo, denuncia o autor, longe de ser apenas um momento histórico vivo na Itália, na Europa (e no Brasil) do século XX, é uma ameaça constante da nossa sociedade.
Ganhou uma provocadora análise no blog Página Cinco, que pode ser conferida aqui.
.Jinga de Angola, a Rainha Guerreira da África (editora Todavia, 320 páginas, preço sugerido R$ 89,90): Uma mulher enfrenta um império. A narrativa, que poderia sair das páginas de um romance contemporâneo, aconteceu de fato no século XVII e é certamente um dos capítulos mais luminosos da história africana.
Esperta e feroz, sábia e arrojada, Jinga desafiou a Europa e tentou inverter – com estratégias completamente inesperadas – a lógica colonial. Quem foi esta mulher, afinal, cujos feitos chegariam até mesmo ao Brasil? Linda M. Heywood reconta essa história eletrizante e traz novos elementos à trajetória da rainha guerreira de Angola cuja astúcia política e destreza militar marcariam gerações de africanos e seus descendentes.
Mulher livre, corajosa e orgulhosa que soube ardentemente defender sua posição e africanidade, e que teve ousadia o suficiente para enfrentar as impiedosas lutas de poder, Jinga permanece viva na memória dos descendentes de escravos no Brasil e na África.
.Se A Rua Beale Falasse (Companhia das Letras, 224 páginas, preço sugerido R$ 49,90): Tish tem dezenove anos quando descobre que está grávida de Fonny, de 22. A sólida história de amor dos dois é interrompida bruscamente quando o rapaz é acusado de ter estuprado uma porto-riquenha, embora não haja nenhuma prova que o incrimine. Convicta da honestidade do noivo, Tish mobiliza sua família e advogados na tentativa de libertá-lo da prisão.
Se a Rua Beale Falasse é um romance comovente que tem o Harlem da década de 1970 como pano de fundo. Ao revelar as incertezas do futuro, a trama joga luz sobre o desespero, a tristeza e a esperança trazidos a reboque de uma sentença anunciada em um país onde a discriminação racial está profundamente arraigada no cotidiano.
Lançado em 1974, o quinto romance de James Baldwin, de quem já falamos antes, inspirou o filme homônimo dirigido por Barry Jenkins, vencedor do Oscar por Moonlight.
.Lá Não Existe Lá (editora Rocco, 304 páginas, preço sugerido R$ 49,90): Estreia literária do americano descendente de indígenas Tommy Orange e um dos livros mais aclamados de 2018 nos Estados Unidos, Lá Não Existe Lá chega ao Brasil pela Rocco e apresenta ao leitor uma narrativa exuberante e inovadora sobre identidade, tradição e tragédia. Pelos olhos de diversos personagens, “índios urbanos” da Califórnia cujas histórias vão convergir no Grande Powwow de Oakland, Orange mostra uma América (do Norte, mas que também faz refletir bastante sobre a do Sul) que muitos se recusam a enxergar.
Powwow é um evento tradicional da cultura indígena norte-americana que promove a integração entre grupos por meio da música. Ou, nas palavras de Tony Loneman, “a gente se veste de índio, com penas e miçangas e tudo. A gente dança, canta e bate um tambor grande, compra e vende troços de índio tipo joias e roupa e arte”.
Com urgência, ritmo e muita sensibilidade, Orange tece uma história que junta lirismo, beleza, crueza e desolação, na qual discute estereótipos culturais, senso de pertencimento e identidade.
.Democracia em Risco? (Companhia das Letras, 328 páginas, preço sugerido R$ 54,90): Democracia em risco? A pergunta que dá título a esta coletânea de artigos procura reagir a uma constatação: as eleições de 2018 são um marco no curso da história de nosso atual regime democrático, iniciado com a promulgação da Constituição de 1988.
Fato novo, um candidato de extrema-direita — de retórica virulenta e ideias conservadoras em matéria de costumes, mas vestindo novíssimo traje ultraliberal em assuntos econômicos — tornou-se contendor imbatível, deixando para trás velhas figuras e partidos que haviam dominado a cena desde a conformação da Nova República.
A vitória de Bolsonaro suscita muitas interrogações, tanto relativas aos processos que levaram a ela quanto às suas consequências, em vários âmbitos. Este é o desafio que se colocou aos pensadores aqui reunidos, notórios especialistas em áreas como ciência política, história, sociologia, antropologia, economia e direito.
Trata-se de um livro de intervenção, que pretende ajudar na compreensão de período que, tudo indica, virá a ser crucial nos rumos que tomarão nosso país e nossa sociedade.
Com textos de: André Singer e Gustavo Venturi, Angela Alonso, Angela de Castro Gomes, Boris Fausto, Carlos Melo, Celso Rocha de Barros, Christian Dunker, Conrado Hübner Mendes, Daniel Aarão Reis, Esther Solano, Heloisa Starling, João Moreira Salles, José Arthur Giannotti, Matias Spektor, Monica de Bolle, Paula Louzano e Gabriela Moriconi, Petrônio Domingues, Renan Quinalha, Ronaldo de Almeida, Ronaldo Lemos, Ruy Fausto, Sérgio Abranches.
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