Texto: Jackson Rocha
Neil Gaiman é, definitivamente, um astro da cultura pop. Reconhecido principalmente por seu trabalho com quadrinhos (Sandman, The Books of Magic, Coraline, além de diversos títulos e contribuições para Marvel e DC), o autor também tem um prolífico trabalho
em outras áreas. Títulos como Deuses Americanos e O Oceano no Fim do Caminho foram aclamados por público e crítica.
Dono de um estilo particular de narrativa, que mescla elementos de mitologia, contos de fadas e fatos cotidianos, Gaiman escreve histórias extremante belas e cativantes. Os Filhos de Anansi (The Anansi Boys, no original) é uma dessas. Talvez não tão conhecido quanto as obras mais famosas do autor, não deve em nada às mesmas.
Nele, somos apresentados a Charles Nancy, um homem normal que leva uma vida normal, onde nada de extraordinário acontece. Da forma como nos é inicialmente apresentado, o personagem é a representação do homem comum, que tem um emprego que não gosta, mas que precisa trabalhar; que tem problemas com autoestima, que mantém um relacionamento morno. Aparentemente, uma pessoa desinteressante, mas que vai passar por transformações ao longo da história.
O ponto de partida para isso é o seu casamento. Particularmente, quando a sua noiva pede para que ele convide seu pai, de quem não guarda boas recordações. Enquanto Charles Nancy é um homem ordinário, seu pai é uma pessoa excêntrica, extraordinária. Mas isso nunca foi motivo de sua admiração, ao contrário, pois o jeito de ser de seu pai não trazia nada além de embaraço (o próprio apelido de Fat Charlie foi um “presente” dele) e frustração por conta da sua ausência.
Ao aceitar o pedido da noiva, Charlie descobre que seu pai está morto e que possui um irmão, com o qual entra em contato. Spider, apesar da semelhança física, é total oposto a ele, sendo espontâneo, charmoso, um tanto quanto falastrão. Com seu aparecimento, a vida de Fat Charlie é colocada de pernas pro ar.
No decorrer do romance, Charles Nancy descobre a verdadeira natureza do seu pai. Anansí é um deus africano, a aranha que tece a teia das histórias do mundo. “Todas as histórias são de Anansí”. Como parte de sua descendência, Fat Charlie começa a descobrir que há mais nele do que o ordinário, mais até que em seu irmão Spider. Esse processo de descoberta e crescimento do personagem é desenvolvido de uma forma espetacular pelo autor.
Também cabe ressaltar o poder das palavras no romance, principalmente na família de Anansí. Vindo de um tempo em que a linguagem escrita ainda não havia sido criada pelo homem, que a tradição era transmitida por via oral, o deus e sua descendência tem o poder da palavra. O autor explora a mitologia de forma brilhante, como em outros de seus livros. Essa vai sendo descoberta ao longo da leitura, como seu fossemos passageiros de Charles Nancy no seu processo de descoberta.
O ato final é belíssimo. Aqui, Fat Charlie finalmente aceita quem é e manifesta todo o seu potencial, como o verdadeiro herdeiro de Anansí. Não deixando de lado o humor que é característico de toda a obra, vemos como os irmãos acabam invertendo de papel no fim, sendo esse o desfecho perfeito para o protagonista.
Os Filhos de Anansi é uma obra muito divertida, que trabalha um universo interessante, através de uma narrativa cativante, sendo quase impossível dar uma pausa na leitura. Aqui, Neil Gaiman mantém a mesma qualidade de suas obras primas. Definitivamente, um dos melhores trabalhos do autor. Vale a pena colocar na sua lista de leitura, ou reler, caso já tenha lido.
Leave a Reply