O Fardo do “S”: Mais do que um Filme, o Lançamento de um Universo. Contém Spoilers.
Assisti ao filme num domingo às 12:40. O melhor horário para fazer isso. Então o texto abaixo é tudo que achei sobre um dos melhores filmes de herois já feito do cinema atual. Saiu 24 horas depois, porque a gente precisa pesquisar e analisar diversos sites e vídeos sobre o filme. É importante contextualizar tudo. É melhor. Para título de SEO do Google, vou usar os nomes originais das personagens em inglês. Não tentem me detonar por causa disso. Na verdade, não me importo, ninguém vai ler mesmo esse texto! Então boa leitura!
O lançamento de Superman em 2025 transcendeu a estreia de um mero blockbuster de verão; ele carregou o peso monumental de uma revitalização de marca multibilionária. Após o encerramento do divisivo e financeiramente instável Universo Estendido da DC (DCEU), a Warner Bros. Discovery (WBD) apostou em uma nova liderança, nomeando James Gunn e Peter Safran como co-CEOs da recém-formada DC Studios. A missão era clara: forjar uma visão coesa e criativa para um novo Universo DC (DCU), e Superman foi posicionado como sua pedra angular, o verdadeiro começo da saga, apesar de a série animada Creature Commandos ter sido o primeiro projeto lançado sob a nova bandeira.
Essa pressão foi amplificada pela supervisão direta do CEO da WBD, David Zaslav, que esperava resultados concretos. Para garantir o sucesso, o filme recebeu um orçamento de marketing colossal de aproximadamente 200 milhões de dólares, significativamente maior que os 150 milhões habituais para uma produção deste porte. Somado ao custo de produção de 225 milhões de dólares, o investimento total aproximou-se de 425 milhões, estabelecendo um ponto de equilíbrio financeiro elevado, estimado em cerca de 562,5 milhões de dólares para alcançar a lucratividade. A campanha de marketing, comparada à de Barbie, adotou uma estratégia de duas frentes: apelo de massa, com parcerias globais com marcas como Samsung e Krispy Kreme, e engajamento de nicho, com conteúdo direcionado aos fãs mais dedicados, como pôsteres de personagens secundários e interações diretas de Gunn nas redes sociais.
A análise da bilheteria de abertura revela uma vitória doméstica com ressalvas internacionais. O filme estreou com robustos 122 milhões de dólares nos EUA e Canadá, superando as expectativas do estúdio e marcando a primeira abertura da DC acima de 100 milhões desde Mulher-Maravilha (2017). Contudo, o desempenho internacional foi mais modesto, arrecadando 95 milhões de dólares, com números particularmente baixos em mercados cruciais como a China (6,6 milhões). Essa performance inicial posiciona o filme como um título impulsionado pelo mercado doméstico, um dado que vai além da simples “fadiga de super-heróis”. A fraqueza global pode ser atribuída a uma confluência de fatores, incluindo a forte concorrência de franquias com maior apelo internacional, como Jurassic World, e a percepção histórica do Superman como um ícone quintessencialmente americano, com menos tração global em comparação com o Batman.
Ainda mais crucial para o futuro da franquia foi a recepção positiva, com uma nota A- no CinemaScore e 82% de aprovação no Rotten Tomatoes. Este é um contraste vital com os filmes divisivos de Zack Snyder, que, apesar de aberturas fortes, não conseguiram sustentar o interesse do público a longo prazo. Essa dicotomia financeira — forte nos EUA, morna no exterior — representa o primeiro grande teste para a estratégia de 10 anos do DCU. A forma como Gunn e Safran interpretarão e reagirão a esses dados do mercado global pode ditar o rumo criativo e comercial dos próximos projetos, forçando-os a decidir entre acelerar títulos com apelo mais universal, como o Batman de The Brave and the Bold, ou confiar que a marca DCU se fortalecerá globalmente com o tempo.
O Paradoxo de Gunn: Sinceridade, Ironia e o Coração do Superman
No centro artístico de Superman reside uma tensão fascinante: a fusão do estilo autoral de James Gunn, conhecido por sua vantagem insolente e humor irreverente, com a essência de um personagem definido pela sinceridade. Gunn, o cineasta de desajustados como os Guardiões da Galáxia e o Esquadrão Suicida, foi encarregado de revitalizar o arquétipo do herói idealista. Críticos apontaram o paradoxo de um diretor definido pela “glibness” (uma espirituosidade superficial) lidando com um personagem tão earnest (sincero). A análise da revista The Ringer chegou a questionar se essa mudança de tom de “edgelord para nicecore” era uma virada genuína ou uma decisão comercialmente astuta.
Para quem não sabe o que é edgelord é alguém, normalmente na Internet, que tenta impressionar ou chocar postando opiniões exageradas, como niilismo ou visões extremistas, já o que nicecore é o contrário.
O próprio Gunn reconhece essa evolução. Ele admite que uma dose de otimismo era necessária para o personagem e que, no passado, teria abordado o Superman com humor mais parecido com o primeiro filme de Os Guardiões da Galáxia. O diretor credita uma mudança em sua perspectiva pessoal, ocorrida após sua demissão temporária da Marvel, como o catalisador para essa nova abordagem. Ele afirmou ter percebido que precisava parar de criar para obter validação externa, uma jornada de autodescoberta que espelha o próprio arco do herói no filme. O Superman de Gunn é um alienígena que busca aceitação em sua terra adotiva e precisa forjar sua identidade para além das expectativas dos outros, sejam elas as de seus pais kryptonianos ou as da humanidade. A jornada do cineasta para encontrar uma voz autêntica e sincera torna-se, assim, a metanarrativa da jornada do herói para fazer o mesmo.
O tema central do filme é um antídoto deliberado para o cinismo contemporâneo. A mensagem de que “a bondade humana básica é um valor” permeia a obra, ecoada pelo elenco. Isabela Merced (Hawkgirl) descreveu o filme como “leve e esperançoso”, enquanto Edi Gathegi (Mister Terrific) o viu como uma “meditação sobre o espírito humano”.Essa abordagem representa uma ruptura drástica com as iterações sombrias e desconstrutivistas de Zack Snyder, focando em um humanismo que prioriza a compaixão sobre a destruição. Ao mesmo tempo, o filme se inspira no espírito do clássico de Richard Donner de 1978, que também surgiu como uma resposta à necessidade de esperança em tempos conturbados.
No entanto, a questão crítica não é se o filme é esperançoso, mas se essa esperança é conquistada ou imposta. O filme parece, por vezes, estar em guerra consigo mesmo, com a sinceridade do Superman lutando para emergir da estrutura caótica e superpovoada típica de um filme do James Gunn. O sucesso artístico da obra, portanto, depende da crença do espectador na conversão do diretor à sinceridade, ou se ele a percebe como uma máscara corporativa para a nova marca DC.
Um Homem para o Amanhã: Análise das Atuações e Personagens
Um dos pontos mais fortes de Superman é seu elenco, liderado por uma performance definidora de David Corenswet. O elenco foi estratégico: Gunn viu Corenswet no filme de terror Pearl e o identificou como um potencial Homem de Aço, não por sua imponência, mas por sua personalidade. A instrução principal de Gunn para o ator foi focar em sua “vulnerabilidade”.Corenswet, que ganhou cerca de 18 kg de músculo para o papel, não se transformou no herói, mas o encontrou ao aprofundar-se em sua própria humanidade. Esse elenco também ressoou em um nível mais profundo; a escolha de Corenswet, um ator de ascendência judaica, foi vista como um retorno simbólico às origens do Superman, criado pelos jovens judeus Jerry Siegel e Joe Shuster. A história do personagem, com seu nome hebraico “Kal-El” e sua identidade dupla como o assimilado “Clark Kent”, é uma poderosa metáfora para a experiência do imigrante judeu.
Ao seu lado, Rachel Brosnahan brilha como Lois Lane. Escolhida pela química inegável com Corenswet, sua Lois transcende o papel de interesse amoroso. O filme destaca deliberadamente a integridade do jornalismo, retratando a busca de Lois pela verdade como uma forma de heroísmo por si só, algo que a própria Brosnahan considerou uma honra interpretar.
O panteão de coadjuvantes, no entanto, revela o principal desequilíbrio do filme. Nicholas Hoult entrega uma performance elogiada como um Lex Luthor maníaco a.k.a Elon Musk, mas o personagem é criticado por ser caricatural e unidimensional. O “A Gangue da Justiça”, um grupo de heróis já estabelecido, introduz personagens como Hawkgirl (Isabela Merced), Mister Terrific (Edi Gathegi) e, notavelmente, o Lanterna Verde Guy Gardner, interpretado por Nathan Fillion, que rouba a cena com seu humor arrogante. No Planeta Diário, Wendell Pierce como Perry White é eficaz mas subutilizado, enquanto Skyler Gisondo oferece uma nova abordagem a Jimmy Olsen como um improvável “mulherengo”. A autenticidade dos pais de Clark, os Kents (Pruitt Taylor Vince e Neva Howell), é convincente como um contraponto realista ao “elenco glam” de filmes anteriores.
Tem excesso de personagens? Tem. Mas esse excesso de personagens não parece ser um erro de roteiro, mas uma necessidade de franquia. Gunn utiliza Superman como um veículo para lançar múltiplos projetos futuros do DCU. Isso cria um conflito fundamental entre as necessidades narrativas de um filme autônomo do Superman e as exigências comerciais de um universo cinematográfico. A crítica de que o próprio Superman é, por vezes, “reduzido a um saco de pancadas retórico e físico” em seu próprio filme é um sintoma direto dessa tensão. A profundidade do protagonista é, em parte, sacrificada em prol da amplitude do universo. Essa filosofia, que opta por uma “desglamourização” e autenticidade nos papéis principais (um Superman vulnerável, Kents “pés no chão”), contrasta com a fantasia extravagante do mundo ao redor, criando uma dissonância que é o cerne da identidade do filme: a busca pelo humano em meio ao espetáculo divino.
Desconstruindo o Mito: Narrativa, Temas e Influências
O roteiro de James Gunn faz escolhas ousadas, tanto na estrutura quanto na mitologia do personagem, visando modernizar a narrativa e estabelecer as bases para o futuro do DCU. A decisão mais imediata é pular a história de origem, um conto já gravado no imaginário popular. O filme começa com um Superman que já atua há três anos e acaba de sofrer sua primeira grande derrota, uma abordagem que lança o público diretamente na ação. No entanto, essa estrutura foi criticada por alguns por seu ritmo apressado, deixando pouco espaço para o desenvolvimento dos personagens e fazendo com que os momentos emocionais perdessem o impacto.
A influência mais notável é a da obra-prima de Grant Morrison e Frank Quitely, All-Star Superman (Grandes Astros). Elementos como o tom otimista, a exploração da solidão do herói, a presença cativante de Krypto e a contemplativa cena pós-créditos de Superman na Lua são homenagens diretas a essa fase dos quadrinhos. Contudo, a mudança mais radical na mitologia vem com a reviravolta sobre a mensagem de Jor-El. O filme revela que a missão original de Kal-El não era ser um salvador, mas sim governar a Terra e garantir a sobrevivência da raça kryptoniana. Essa revelação força uma profunda crise de identidade em Clark, que, ao final, rejeita seu legado biológico e abraça sua criação humana, trocando as mensagens de Krypton por memórias de seus pais terrestres.Embora seja uma decisão narrativa potente, seu impacto é subdesenvolvido, resolvido de forma apressada com uma única conversa significativa com Pa Kent e uma montagem final, exemplificando a crítica de que o filme é “largo, mas não profundo”.
Politicamente, Gunn enquadra a história como uma narrativa de imigrante, um “alienígena vindo de outro mundo tentando fazer uma vida aqui”. Essa interpretação gerou debate, mas o tratamento do ângulo geopolítico, com as nações fictícias de Boravia e Jarhanpur, foi considerado superficial e sem a convicção necessária para aprofundar o tema. E a produção não teve qualquer cuidado como é a geografia de um país leste europeu com elementos do oriente médio. Achei bem feito na moral.
Olhando para o futuro, o clímax do filme prepara o terreno para uma sequência. A luta de Superman contra Ultraman, um clone genético criado por Lex Luthor, não termina com a morte do vilão. Em vez disso, Ultraman é sugado para uma dimensão de bolso, um destino que alimenta a teoria predominante de que ele retornará como Bizarro, o icônico doppelgänger imperfeito do Superman. A estrutura narrativa do filme, portanto, reflete a filosofia de Gunn para o DCU: construir um “mundo” em vez de uma “linha do tempo”. Ao começar com heróis já estabelecidos e um universo povoado, ele contorna a abordagem faseada da Marvel, apostando que o público está sofisticado o suficiente para acompanhar. É uma estratégia que prioriza a construção do universo em detrimento do desenvolvimento individual, uma escolha definidora para o futuro da franquia.
A Estética de um Novo Kryptoniano: Cinematografia, Som e Espetáculo
A identidade visual e sonora de Superman é tão distinta quanto controversa, refletindo a tentativa de James Gunn de criar uma estética única para o novo DCU. Filmado pelo diretor de fotografia Henry Braham com câmeras digitais RED V-Raptor e lentes Leica Tri-Elmar (Eu tive que ficar até o fim dos créditos para tirar uma foto desses nomes), o filme possui um visual de cores vibrantes e alta nitidez. Essa combinação, no entanto, gerou críticas.
O design de produção buscou um equilíbrio entre o clássico e o moderno. O traje do Superman, com o emblema “S” inspirado na HQ Reino do Amanhã, foi concebido para parecer um “uniforme” funcional, não uma armadura mágica. A Fortaleza da Solidão abandonou o visual de Donner por um design mais dinâmico, inspirado na forma como a água colide com as rochas. Um dos maiores sucessos visuais é Krypto, o supercão, animado com base em extensas filmagens do próprio cachorro de Gunn, Ozu, para capturar uma anatomia e expressividade realistas. A dedicação à qualidade dos efeitos visuais foi evidente no longo período de pós-produção, que durou quase um ano.
A trilha sonora, composta por John Murphy e David Fleming, emergiu como o elemento mais divisivo do filme. A principal e melhor crítica é que a música é genérica, soa “barata” e depende excessivamente de trechos repetidos do icônico tema de John Williams. A orquestração foi descrita no site Zanobard como “sintética” e “oca”, carecendo da grandiosidade esperada.
Apesar disso, a trilha contém motivos originais para personagens como Lex Luthor e o uso de canções de punk rock, como “Punkrocker” dos Teddybears, é um toque característico de Gunn que se conecta tematicamente à narrativa.
Mas eu gostei. Só que a trilha sonora do Homem de Aço do Hans Zimmer é CINEMA. Obra-Prima. É meio covardia comparar.
Veredito e o Futuro do DCU: Um Começo Sólido ou um Falso Amanhecer?
Superman de James Gunn chega como um sucesso qualificado, uma obra que, embora artisticamente falha, cumpre sua missão mais crucial: restabelecer o Homem de Aço como um farol de esperança e lançar o DCU sobre uma base crítica e comercialmente sólida. Seus pontos fortes são inegáveis: a performance cativante e humana de David Corenswet, que se consagra como o Superman para uma nova geração; um tom otimista que serve como um bem-vindo contraponto ao cinismo reinante; o humor eficaz de personagens como Guy Gardner e o adorável Krypto; e uma representação forte e íntegra de Lois Lane e do jornalismo.
Contudo, suas fraquezas são igualmente evidentes. A narrativa superpovoada sacrifica a profundidade do protagonista em prol da construção do universo, o vilão é caricatural, o ritmo apressado dilui o impacto emocional de momentos-chave e a trilha sonora é uma decepção para muitos, mas não para mim, compensa. Comercialmente, o filme precisa de uma forte sustentação para atingir seu alto ponto de equilíbrio de aproximadamente 562,5 milhões de dólares. recepção positiva do público sugere que isso é possível, especialmente no mercado americano, mas a performance internacional continua sendo uma incógnita.
Olhando para o futuro, o filme estabelece com sucesso as bases para o Capítulo 1 do DCU, “Deuses e Monstros”. A filosofia de Gunn, focada em histórias individuais em vez de uma saga interconectada sufocante, é refletida nas cenas pós-créditos, que priorizam momentos de personagem em vez de grandes revelações de enredo.O filme planta sementes diretas para Supergirl: Woman of Tomorrow (2026), com a introdução de Milly Alcock como uma Kara Zor-El mais “hardcore”; a série Lanternas, com a presença de Guy Gardner; The Authority, através da Engenheira; e a segunda temporada de Peacemaker.
Em suma, Superman funciona mais como um piloto de série de alto orçamento para todo o DCU do que como um filme perfeitamente focado em seu protagonista. Resultando em uma obra que é, ao mesmo tempo, charmosa e caótica, sincera e superlotada. Não é o amanhecer perfeito, mas é, inegavelmente, um amanhecer. Ele limpa o céu nublado deixado pelo DCEU e oferece a promessa de um dia mais claro pela frente, mesmo que as primeiras luzes revelem uma paisagem um tanto desordenada e ainda em plena construção.














Concordo em gênero, numero e grau.
Oh, Alguém leu minha resenha! Obrigado!! Venci na vida!!