Essa resenha foi escrita no dia 25 de Dezembro, aqui não fazemos ceia de Natal, mas almoço, então eu sai de uma mesa farta de comida para terminar de assistir The Witcher e escrever isso para os leitores. Então, tenha ao menos a delicadeza e educação de ler até o final. Prometo que não vou me demorar por aqui e por incrível que pareça, não contém spoilers.
É inevitável que The Witcher, da Netflix, seja comparado a Game of Thrones, da HBO. Ambos são séries de fantasia baseadas em livros famosos, e The Witcher foi lançado logo após o fim de Game of Thrones, então essa comparação existirá.
No entanto, essa comparação não é justa com as duas séries. Depois de assistir os oito episódios de The Witcher, você sente claramente que ambas as séries estão buscando coisas relativamente diferentes, apesar de serem um pouco parecidas. E como já disse meu querido autor de fantasia brasileiro, Leonel Caldela, Fantasia é um gênero e não apenas uma série.
Pronto. Não falarei mais de Game of Thrones na resenha do The Witcher.
The Witcher é baseado na série de livros de mesmo nome (com algumas sutis referências aos jogos), mas você não precisa ser um fã de nenhum deles para entender o que está acontecendo. Sua premissa básica segue Geralt de Rivia (O Bruxão) enquanto ele percorre reinos e vilas, aceitando o trabalho de caçador de monstros e executor de outras tarefas difíceis e desagradáveis. O cara é mercenário que todo mundo odeia, mas que todos precisam já que esse mundo é habitado por seres das trevas e mágicos. Enquanto isso, a princesa Ciri, do reino de Cintra, é forçada a deixar sua terra depois que sua família e seu povo são massacrados pelo Império Nilfgaardiano. Armada com nada mais do que algumas palavras proféticas compartilhadas por sua avó, que parecem sugerir que ela está destinada a se encontrar com Geralt, ela começa a vagar por um mundo que é muito mais cruel e místico do que o que uma vida vivida no castelo a levaria acreditar.
Mas The Witcher, a série, apresenta diversos problemas. E tentarei contar alguns que me deixaram um pouco insatisfeito. Os primeiros episódios têm mais uma função de aprofundar o mundo que os personagens centrais estão vivendo (Geralt, Ciri e Yenefeer), estabelecendo um pouco da origem de cada um e experimentar uma série de aventuras que estão um pouco mais próximas de um “formato do monstro da semana”, sinceramente não achei que esse formato de narrativa tenha dado certo.
Confesso que assistir sem nunca ler os livros, jogar o RPG ou mesmo jogar os videogames de The Witcher. No entanto, graças as pesquisas que precisam ser feitas sobre algo que você não conhece bem, os jogos utilizam um formato semelhante ao que foi usada na série e o primeiro livro da coleção The Witcher também oferece histórias curtas e aventuras que acabam se transformando em uma história maior.
O que faz esse formato funcionar (os jogos) é que eles estão repletos de personagens complicados e muitas vezes moralmente ambíguos que habitam um mundo místico fascinante, repleto de lendas e intrigas políticas. Você se sente bem pulando de personagem para personagem e de história em história, porque as coisas no periférico são frequentemente tão interessantes (ou mais interessantes) quanto o enredo “principal”.
Esse não é o caso da série The Witcher, da Netflix, que falha ao executar essa fórmula porque falha em apresentar dois dos aspectos mais importantes do livro: personagens de qualidade e boas histórias.
De fato, um dos maiores problemas deste programa é que a maioria de seus personagens são, na verdade, caricaturas. Com poucas exceções, você sabe exatamente quem é o personagem no momento em que é apresentado, e o programa raramente se incomoda em desafiar suas expectativas por meio da subversão ou simplesmente permite que um personagem encontre seu caminho antes de se estabelecer.
De longe, o exemplo mais flagrante dessa falha vem na forma de um bardo viajante, Jaskiel, que acompanha Geralt em suas aventuras. Não é exagero dizer que 95% de suas falas são piadas, e 90% dessas falas são sem graça. Dizem que não há nada tão ruim quanto uma comédia sem graça, e esse personagem certamente faz sua parte para provar essa teoria. Vou além, algumas de suas falas nem fazem sentido no contexto de um mundo que tem uma cultura e progressão histórica diferente da nossa. O ator é muito bom, na verdade, um dos melhores da série, mas não deu certa sua proposta na narrativa da série.
Mesmos personagens que se beneficiam de um tempo substancial na tela acabam sendo esquecidos ou envolvidos em tramas frágeis. As aventuras da princesa Ciri (Freya Allan), que em grande parte fica pulando de um local para outro para ser um pouco participante da história desinteressante de outra pessoa, é um dos exemplos mais infelizes de um personagem subutilizado, mas isso não é nada comparado ao que obtemos com o personagem de Yennefer (Anya Chalotra).
Seus motivos e sua busca são generosos, cruéis e poderosos nos primeiros episódios, mas ela acaba num turbilhão de histórias clichês e sem consistência. Na verdade, existem vários casos em que as histórias de The Witcher me lembram meus contos infantis estúpidos (sim, eu escrevo contos infantis), em que eles tentam ser sombrios, mas tudo é uma grande homenagem com paródias de contos de fadas. A diferença é que meus contos são muito mais envolvente. Mas tirando essas camadas ruins de roteiro e ritmo, Anya Chalotra fez o melhor desempenho da série. Para ela eu tiro meu chapéu.
Tudo em The Witcher poderia ser melhor descrito, melhor acabado em termos de entregar o que você mais espera de uma história de feitiçaria, política e drama.
Henry Cavill apresenta um desempenho acima da média como Geralt, mas é amplamente limitado a grunhidos, mesmo ele fazendo todas as cenas de lutas. Me lembrou como Tom Hardy foi usado em Mad Max: Estrada da Fúria, mas a grande diferença entre os dois foi que Hardy naquele filme foi usado como veículo para certos pontos da trama e o gancho para um mundo muito mais interessante, repleto de caracteres mais intrigantes.
Em vez de temas e ideias gerais mais amplos, The Witcher deixa você se apegando desesperadamente ao bom plot que o leva a acreditar que algo interessante pode vir disso tudo. Por exemplo, você pode ter ouvido ou lido em algum lugar o quanto as sequências de ação são incríveis, mas cenas de lutas tem menos a ver com a coreografia e mais com as emoções, prestamos mais atenção nos personagens participantes de cana e na força da situação. Em The Witcher, você fica com lutas que não têm peso real e dependem de coreografias que nem chegam perto de serem boas o suficiente para transportar a carga com base apenas na virtude de sua execução e mérito técnico.
Foi difícil imaginar no capítulo final, uma a reviravolta criativa para compensar os erros de narrativa dos episódios anteriores, mas foi abaixo da média até de minhas expectativas.
Às vezes as adaptações permitem conceder a si mesmo a perspectiva de sair do processo criativo inicial e os apegos emocionais que vêm com ele para descobrir o que realmente faz alguma coisa funcionar e o que a impede de ser tudo o que pode ser. Precisa manter os elementos originais da obra original? Claro! Mas que faça isso de uma forma criativa e fluída.
A Netflix já confirmou que a segunda temporada será mais concentrada nos elementos que fazem The Witcher sucesso mundial. Muita gente teve problema com a linha do tempo do trio principal, não era complicado. A Netflix se defendeu falando que a primeira temporada foi uma espécie de introdução ao mundo fantástico de The Witcher. Bem, esse mundo tem terror, ele é cruel e isso ficou a desejar na primeira temporada.
Lerei os livros que saíram no Brasil e assim, ter uma opinião melhor sobre o universo The Witcher. É uma série agradável de assistir, não achei maçante ir até o final. Precisa melhorar? Precisa, principalmente o ritmo. Fazer série de fantasia parece que ainda é um o calcanhar de aquiles dos produtores americanos.
Por fim, só queria lembrar que essa opinião é apenas minha e não é o que o site Quinta Capa acha. Não me apedrejem e também avisar que a versão dublada é melhor que a versão original.
The Witcher está disponível na Netflix.
4 Comments