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O SUPERMAN QUE ZACK SNYDER LEU (e não entendeu!).

Após 8 anos do lançamento de O Homem de Aço, as influências do diretor Zack Snyder já são bem claras para os fãs de quadrinhos e do diretor. Porém, 02 filmes depois (Batman vs Superman e Liga da Justiça), o Snyder parece que não entende bem o que lê nas páginas das hqs que possivelmente o inspiraram. O caso mais notório se passa com Superman – Pelo Amanhã.

Superman por Jim Lee
De cara já vemos a influência de Jim Lee no Superman de Snyder. Porém, o que o diretor parece esquecer é o que o próprio herói fala ao começo de Pelo Amanhã, ao afirmar que, infelizmente, vê medo no rosto de quem não devia enquanto os seus inimigos não o temem.

Após toda a movimentação das últimas semanas sobre a versão do diretor de Liga da Justiça, um trambolho de 4 horas, que transforma a trindade da DC em um trio de psicopatas, me peguei pensando sobre as influências de Zack Snyder para a caracterização do seu Superman.

É clara a intenção do diretor em adaptar Injustiça – Deuses entre nós, famoso jogo para ps3 e xbox 360 e quadrinho pelo escritor Tom Taylor onde, após a morte de uma Lois Lane grávida e a destruição de sua cidade pelos atos do Coringa, o Superman se transformaria em um tirano e entraria em rota de colisão com o Batman. Com toda a trama envolvendo Darkside e a equação antivida, Snyder chegaria nesse ponto, com um futuro distópico, se não tivesse sido limado pela Warner Bros (ainda bem!).

Henry Cavill como Superman
É inegável como o diretor é visualmente bastante influenciado pelos quadrinhos. Porém, imagem sem conteúdo é como uma bela capa que vende uma história ruim!

Porém, a caracterização de um Superman messiânico, um jesus moderno, atormentado por seus poderes e que tem dificuldade de se ligar à humanidade, sendo Lois Lane a sua âncora moral (junto com pais terráqueos que parecem obstinados a torná-lo uma péssima pessoa), não é proveniente de Injustiça, já que isso vem desde Homem de Aço (2013), filme lançado antes até do que o jogo, que é do mesmo ano. Pois o  primeiro saiu no começo daquele ano enquanto o vídeo game estreou no final de 2013.

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Superman de Injustice
Abalado por ter matado Lois Lane enquanto estava sob efeito do gás do medo e por ter deixado uma bomba nuclear explodir Metrópolis, o Homem de Aço de Injustiça é um tirano.

Em que pese as várias histórias de um Superman com características religiosas, já que seus criadores, dois judeus, o inspiraram na história de Moisés, e as tantas mais que o veem como um possível tirano (sagas como Rei do Mundo), aquele herói atormentado e que carrega um grande fardo nas costas me era particularmente familiar como leitor.

Puxando da memória, e da minha coleção, é inegável a influência de Superman – Pelo Amanhã (2004-2005) no trabalho de Snyder com o personagem. Explico.

Superman – Pelo Amanhã é escrito por Brian Azzarello, conceituado roteirista de histórias policiais, que, tirando o Batman, se mantém distante de super-heróis. E ver o texto de Azzarello ao lado de Jim Lee, famoso desenhista que se tornou notório ao desenhar X-men na década de 1990 para a Marvel, pode não ter sido uma das melhores escolhas da DC. Por mais que eu reconheça o quanto eu gosto dessa história, é inegável que o texto e arte puxam para lados diferentes. É como se o texto quisesse um Superman humano, enquanto a arte é puro super-herói colorido e pancadaria.

Mulher-Maravilha por Jim Lee
Ao ler a participação da Mulher-Maravilha em Superman – Pelo Amanhã, o leitor perceberá como Zack Snyder se inspirou na caracterização de Azzarello para a personagem.

Bem, Superman – Pelo Amanhã vale uma matéria de análise só pra essa saga em 12 partes. Em especial as partes que jogam contra a qualidade da história, como o destino (horrível) do padre Leone e a origem do aparelho que faz com que várias pessoas sumam do planeta Terra, inclusive Lois Lane.

Bem, mas onde Pelo Amanhã inspira Zack Snyder, ponto central desse texto? Em tudo! Na parte visual e nas motivações do Superman em grande parte. É uma pena que Zack Snyder é um diretor limitado e não tenha entendido a complexidade que Azzarello tentou nos passar aqui.

Para começar, Pelo Amanhã acompanha um Superman atormentado, e se confessando (só um dos vários pontos religiosos na trama) a um padre que está com câncer terminal. A agonia de Superman nasce do fato dele estar longe quando ocorreu o desaparecimento de 300 mil pessoas pelo mundo. Uma espécie de arrebatamento bíblico (olha a religião aí novamente!). Entre os desaparecidos, está Lois Lane, a esposa do herói.

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E aqui entra um ponto que Snyder parece não ter entendido, apesar do seu Superman ser atormentado e com dificuldades para se conectar com a humanidade. Em seus três filmes (Homem de Aço, Batman Vs Superman e Liga da Justiça), a bússola moral do Superman é única e exclusivamente seus pais e sua esposa. O herói parece salvar os outros e fazer o bem como uma obrigação muito pesada. Só que o texto de Azzarello mostra que, mesmo atormentado e sozinho, o último filho de Kripton ainda é um herói, fazendo o bem ao próximo e dando a eles esperança.

Superman e Zod pelo traço de Jim Lee
Até mesmo quando seu paraíso está sendo destruído e o herói age contra o tempo, Superman ainda tenta salvar Zod, seu grande inimigo. Aqui temos uma semelhança visual, ao Snyder utilizar um Zod de armadura e obstinado a destruir o legado de Jor-El (pai do herói), e uma diferença conceitual, pois o último filho de Kripton tenta salvar a todos, mesmo em momentos de urgência, não caindo em uma saída fácil que é matar seus adversários.

O herói, sim, toma medidas extremas (nada do nível de quebrar pescoços!) ao invadir um país africano onde foi a origem do desaparecimento. Se deparando com uma guerra civil, o herói confisca todas as armas daquela guerra. Mas a natureza do ser humano é muito complicada, já que o nós guerrearíamos e nos mataríamos mesmo com paus e pedras.

E aí, entra uma similaridade e uma diferença entre o quadrinho e o texto de Snyder. Pois o Superman sofre pelos atos da humanidade, mas, na HQ, ele continua a fazer o bem, mesmo que por caminhos difíceis. Ele não se abstêm, ao contrário de em Homem de Aço, onde o jovem Clark Kent deixa seu pai morrer para manter sua identidade em segredo.

Quando você assiste Liga da Justiça de Snyder, o agora famoso SnyderCut, temos um Superman que após ressuscitar (outro fator religioso) só aparece para espancar e mutilar um inimigo. Da mesma forma que em Batman vs Superman, após perceber os atos brutais do Batman, o Homem de Aço vai a Gotham e …… simplesmente ameaça o homem morcego, não tentando fazer nada pela cidade.

Henry Cavill como Superman
Mesmo fazendo o bem, a todo momento o Superman de Zack Snyder está amargurado e inseguro. Não lembrando em nada um símbolo de salvação. E olha que ele falou que esse S no peito dele significa esperança em Kripton!

Outro ponto em comum é o destaque ao lado alienígena de Superman. Abandonando o lado jornalista de Clark Kent, as duas obras se assemelham neste ponto, porém, pasmem, Snyder ainda sabe trabalhar melhor com isso, mesmo que seja pouco. Essa foi uma opção de Azzarello ao afastar elementos como o Planeta Diário e a própria Metrópolis da narrativa.

Superman por Jim Lee

Superman – Pelo Amanhã e a obra de Snyder na DC tem vários pontos em comum. Não que snyder tenha se baseado só no trabalho de Azzarello e Jim Lee, claro, porém, a influência é notável.

Mas, fica claro que até um escritor de histórias polícias, que tem aversão a super-heróis, tem mais noção do lado humano e religioso do último filho de Kripton. Ao criar uma legião de fã tóxicos, o diretor apenas se distanciou mais do caráter religioso que o personagem pode ter, como mensagens de amor ao próximo.

Thiago de Carvalho Ribeiro. Apaixonado e colecionador de quadrinhos desde 1998. Do mangá, passando pelos comics, indo para o fumetti, se for histórias em quadrinhos boas, tem que serem lidas e debatidas.