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Tudo sobre a live de Cassius Medauar e Sidney Gusman

Cassius Medauar conta sobre como será a nova editora Conrad nessa live com Sidney Gusman

Na noite do dia 05/06 aconteceu uma live que muito marmanjo ficou feliz em acompanhar, isso porque juntou dois dos mais queridos editores de quadrinhos do Brasil. Se você tem mais de 30 anos ou acompanhou a chegada dos mangás no Brasil pela editora Conrad, se conhece A Turma da Mônica e o que significa o selo Graphic MSP pro mercado de quadrinhos no Brasil, sabe de quem estou falando: de Sidney Gusman e Cassius Medauar.

A live aconteceu um dia após a editora Conrad anunciar que Medauar, a prata da casa, estava voltando para sua cozinha depois de mais de 10 anos de hiato onde trabalhou em editoras como Pixel e JBC.

O retorno de Cassius Medauar à Conrad causou excelente impressão em todo o público leitor e seu nome chegou ao 20º lugar nos trending topics no twitter no dia de ontem. A verdade é que muitos sequer sabiam que a editora ainda existia.

Sidney Gusman e o pessoal do Universo HQ chamaram o editor para uma live no youtube para tirar as dúvidas do público que sonha com o retorno áureo da editora, responsável por trazer a grande onda de quadrinhos nipônicos no Brasil, no início dos anos 2000, com títulos como Dragon Ball e Cavaleiros do Zodíaco, além de Gen Pés Descalços e Buda.

O que me proponho aqui é tentar sintetizar os principais tópicos comentados em quase 2 horas de vídeo, de muita simpatia e conversa com o público.

Cassius Medauar falou que se sentia como que voltando para casa, com uma energia muito bacana, lembrando que foi na Conrad onde desenvolveu seu primeiro trabalho como editor.

Sidney Gusman comentou que sugeriu à Conrad o retorno de Cassius à editora, que o considera um de seus melhores amigos, e que na Conrad trabalharam juntos em muitos títulos, não só mangás, mas em quadrinhos como a coleção Sandman, em 10 volumes que, segundo Sidney, é a verdadeira edição definitiva do título, repetindo o que disse no podcast que fez com Rogério de Campos, outro parceiro dos tempos da Conrad (acesse o podcast aqui).

O carinho mútuo entre os dois ficou evidente durante toda a live, com Sidney fazendo elogios ao amigo, que respondia, chamando Sidney por “Sidô”, com uma entonação que me lembrava um aluno dirigindo-se a um honorável senpai.

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Sidney Gusman mostra foto antiga de Cassius Medauar com Neil Gaiman

Cassius comentou que saiu há quase 1 ano da JBC, onde lá trabalhou e ajudou a torna-la uma das principais editoras de mangás do Brasil, com títulos como Akira, Ghost in the shell e Nausicaä (que está em produção) no catálogo. Seu retorno foi veiculado no meio de uma pandemia, como um sopro bem vindo, uma boa notícia, para levantar uma editora que estava, praticamente, sumida.

Curiosamente, semana passada, antes de seu nome ser soprado nas redes sociais, a Conrad havia feito uma publicação no facebook avisando que estava recebendo propostas de material brasileiro para avaliação. A notícia levantou muita perplexidade, pois a impressão geral no mercado era de que a editora sequer existia. “A conrad ainda tá viva?”, comentavam, maldosamente, nos grupos.

O fato é que trazer Cassius Medauar de volta é uma contratação grande diante de um cenário cada vez mais complicado e inseguro, mas o editor não se amedronta. Disse que acima dele, em questão de decisões editoriais não havia ninguém na Conrad, a não ser os donos do grupo Ibep, que comprou a conrad em 2009, evitando que ela, realmente, viesse à falência.

Mas antes que o público surtasse, pedindo republicações impensáveis de Cavaleiros do Zodíaco Saga G, Cassius tratou de jogar uma bacia de água morna, mas com muita transparência. Ele disse, e era possível ler as letras garrafais saindo de sua boca em vários momentos, que a Conrad NÃO iria relançar NENHUM dos mangás que estavam em seu catálogo, simplesmente porque 1)os contratos haviam expirados, que a Conrad não tinha mais, praticamente, nenhum dos direitos dos grandes títulos do passado e que não conseguiriam eles de volta , primeiro porque muitos desses títulos já estavam de casa nova, como Evangelion, Vagabond, Nausicaa, ou 2) porque os direitos para publicá-los hoje seriam muito caros, ou 3) porque, simplesmente, a Conrad não conseguiria a liberação com as editoras japonesas porque ela teve muitos problemas com cancelamentos de títulos, ficando com o nome sujo lá fora por falta de pagamentos no passado e 4) que estão, no momento, saindo de uma recuperação judicial.

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Então, tudo exige muita calma, andar confiante, com devagar e cuidado. Cassius prometeu trabalhar, de imediato, com títulos que ainda possuíam os direitos, e que são dois grandes contratos: Calvin e Haroldo e Gen Pés descalços. Fora isso, não possuem quase nada.

A ideia, dando o furo para a retomada do catálogo da Conrad, é a conclusão da obra de Calvin e Haroldo no Brasil, que faltam apenas 2 dos 18 títulos da coleção, e que pretende lança-las ainda este ano.

Outra ideia é reimprimir volumes, tanto de Calvin quanto de Gen, que estejam esgotados, entretanto, existe outro problema quanto à isso: para muitas dessas edições ainda existe estoque, mas estão trancafiadas nos porões das grandes livrarias que pediram falência nos últimos anos, como Saraiva e Cultura, e é preciso esperar decisão judicial, para que essas edições possam voltar às prateleiras da editora. Uma das ideias é fazer boxes de Calvin e Gen, mas para isso, é preciso que as livrarias resolvam seus problemas, paguem às editoras e devolvam o estoque restante aos respectivos donos.

Cassius deixou claro que este primeiro momento é de reconstrução, de prospecção de títulos e não sabe se lançará mangás em pouco tempo, justamente pela dificuldade de negociar os títulos como o Japão e que, por isso, uma das possibilidades é lançar material nacional, além de trabalhar com venda de títulos digitais, à exemplo do que fez na JBC.

Segundo o editor, é possível que a Conrad trabalhe tanto com grandes títulos, mundialmente conhecidos, quanto com novos autores brasileiros, que possam entrar no catálogo da editora, inclusive para vendas digitais, afinal, é preciso dar opções para o leitor adquirir um produto, seja através de pequenos capítulos por R$2 ou R$3 ou livros digitais pela metade do preço de um livro impresso.

Cassius Medauar deixou claro ainda que o “grande barato” do cenário atual são as vendas on line, por conta dos fechamentos irrefreáveis das bancas por todo o Brasil, e também do comércio de títulos digitais. Que é preciso essa adaptação aos novos tempos, mas que também trabalharão com as comic shops (ufa!).

Aliás, é importante lembrar aqui que a JBC, sob sua supervisão, foi uma das poucas editoras que criaram site próprio e que facilitou o comercio com o pequeno livreiro. Digo isso por experiência própria: é quase impossível comprar diretamente com a Panini, por exemplo, com descontos mais generosos e competitivos, sendo que somos obrigados a negociar com distribuidores que mordem parte do valor de capa nesta terceirização. Por isso, espero que Cassius faça da mesma forma nesta nova Conrad, como fez na JBC.

O convidado do Universo HQ não pôde dar muitas garantias ou adiantar serviços,  justificou-se dizendo que estava há apenas 15 dias de volta à sua casa, mas garantiu que a Conrad terá diálogo franco com o leitor. À exemplo do que fez na JBC, criará um canal no youtube para a Conrad dialogar abertamente com seu público.

Ele lembrou que quer lançar autores nacionais e que deve receber propostas de material. Lembrou que o chamamento para propostas de autores nacionais já estava nas ações da Conrad quando ele retornou, e que não foi ideia sua fazer aquela publicação no facebook, que citamos aqui anteriormente, mas que gostou muito e que tem estudado os autores que entraram em contato.

Segundo Casssius, ele não decidiu voltar para a Conrad no primeiro convite, teria sido necessário “muitas conversas para aceitar”, que não trabalharia em qualquer projeto do grupo Ibep, a atual dona da editora. A corruptela que fez com o lema “make Conrad great again” foi citado pelo novo editor da Conrad, pois só assim valeria à pena voltar para casa.

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Sidney Gusman não calou o grito de “CONRAD, DEIXA O CASSIUS TRABALHAR”, como uma fórmula necessária para que as coisas possam dar certo. No meio da conversa, ainda deixando claro seu carinho e admiração pelo colega, Sidney Gusman apontou que “a Conrad é que tá voltando pro Cassius”, indicando que o caminho para fazer a Conrad grande novamente já parece estar definido no âmago desta contratação.

Cassius Medauar falou, em alguns momentos, sobre manter o espírito da Conrad do passado, que significava reforçar o diálogo com os leitores e incentivar as livrarias, mas que é preciso se adaptar para o mercado atual, que não há mais tantas bancas: “Quem vai pra banca hoje? Banca morreu!”, assassinou (ops! Quer dizer, “assinalou”). Uma das opções para isso é trabalhar com o quadrinho nacional, pois com o dólar e o euro tão altos, torna-se mais interessante negociar com nossos autores locais, inclusive com talentosos jovens iniciantes, que é importante fazer boa divulgação deles e que podem estar num plano inicial da editora, principalmente em vendas digitais.

A editora, como já dissemos aqui, passou por dificuldades, teve títulos cancelados e coleções incompletas, o que divide os fãs e levantam muitas críticas. Portanto, é necessário recuperar a imagem da Conrad junto a esse público e, para Cassius, essa reconstrução vai passar, exatamente, pela transparência total de sua parte, que ficou evidente em vários sonoros “nãos!” que soltou, respondendo a retardatários expectadores da live sobre a possibilidade da volta de um ou outro título antigo da editora às bancas.

Ainda surgiram vários assuntos pontuais, como a utilização do Catarse para lançamento de novas edições. Sobre isso, Cassius disse que a JBC teve sua experiência com Combo Ranger no Catarse (inclusive, muito bem-sucedida, com 711 apoiadores, 168% da meta atingida e R$67.540,00 em dinheiro arrecado). Disse não gostar de fazer tudo por lá, mas que acha uma plataforma “bem legal”, pretendendo usá-la se desenvolver projetos específicos para ela.

Comentou também sobre a política de preços, que não é possível mais fazer quadrinhos baratinhos, porque não há mais grandes tiragens, devidos aos graves problemas de banca e distribuição no Brasil. E que, portanto, não há mágica, que quando o preço do dólar cai, as gráficas não repassam o preço para as editoras e que o melhor que podem fazer é manter o preço estável pelo maior tempo possível.

Ainda sobre os preços, Cassius comentou algo do qual eu concordo e que, assim como alguns dos presentes, assinamos embaixo: que quadrinhos de R$20 ou R$30 hoje em dia não são caros, já que esse é um valor que você gasta em um lanche do McDonalds, que não é aceitável que alguém que gasta R$100 ou R$200 numa baladinha, reclame de preço de gibi.

Ainda contou várias histórias, entre elas, sobre almoços com Neil Gaiman, disse que meio tanko não faz mais sentido, falou sobre o prêmio Jabuti e sobre seu chapéu mágico, coletor de títulos que usa para decidir quais as publicações que serão agraciadas pela editora. Ainda zoaram editores amigos, da Devir e de outros encontros profissionais, e sobre as saudosas sessões de carta nas antigas revistas que editaram.

Uma live que precisa ser assistida para conhecermos melhor capítulos, relativamente recentes, da história dos quadrinhos nacionais e sobre como serão as novas páginas escritas pela Conrad e que seja, de novo, uma das maiores!

E se, com tudo isso, você ainda não quer assistir à live, fique com as imagens de Sidney Gusman e Cassius Medauar fazendo coraçãozinho, fusão ao estilo Dragon Ball e gritando Kamehameha!!!

Sou desenhista, criador do Máscara de Ferro e autor do quadrinhos Foices & Facões. Sou formado em história e gerente da livraria Quinta Capa Quadrinhos